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Guias e Dicas
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Por Deus, pela Pátria e pela Coca-Cola, Manuais, Projetos, Pesquisas de Publicidade e Propaganda

Livro que conta a história da Coca-Cola desde quando ela era um simples xarope, do qual curava-se depressão!

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2011

Compartilhado em 04/11/2011

daniele-meneguci-5
daniele-meneguci-5 🇧🇷

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Baixe Por Deus, pela Pátria e pela Coca-Cola e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Publicidade e Propaganda, somente na Docsity!

MARK PENDERGRAST

POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

Por Deus, Pela Pátria e Pela Coca-Cola é uma história cultural, social e econômica da

América, vista através do vidro de uma garrafa de Coke. E que crônica tipicamente americana

que ela é! A Coca-Cola começou humilde, como remédio sem rótulo vendido em feiras, em

meio ao entusiasmo e caos de Atlanta, no período de Reconstrução que se seguiu à Guerra

Civil. Um empresário astuto percebeu-lhe o valor como bebida, que rapidamente se popularizou

durante a Idade de Ouro até tornar-se o bem de consumo dominante do Século Americano. A

razão do sucesso da Coca-Cola foi uma publicidade onipresente, enquanto os mestres criadores

de mitos da Companhia despertavam e em seguida saciavam a sede de uma nação. E quando a

II Guerra Mundial levou tropas americanas ao ultramar, o refrigerante seguiu-lhe as pegadas,

lançando os alicerces de uma presença mundial duradoura e lucrativa.

Valendo-se de inúmeras fontes até então inéditas, Por Deus, Pela Pátria e Pela Coca-Cola

traça um retrato vivo dos empresários que dirigiram a empresa: o devoto metodista Asa

Candler, que trouxe a Companhia ainda implume ao século atual; Robert Woodruff, com o

indefectível charuto amassado na boca, o anfitrião de presidentes americanos em sua fazenda

na Geórgia; e o aristocrático Roberto Goizueta, de antecedentes cosmopolitas e dotado de uma

visão que lhe permitiu abrir os mercados mundiais. Todos eles deixaram uma marca indelével

na Coca-Cola. O livro conta ainda com um pitoresco elenco de coadjuvantes, constituído de

picaretas, trapaceiros, publicitários, e vigaristas que transformaram o refrigerante na marca

registrada mais conhecida em todo o mundo. O lado negativo da Coca-Cola também está

presente: manobras legais excusas, acordos de compadres com políticos, tratamento brutal a

concorrentes e trabalhadores do Terceiro Mundo. A despeito de uma imagem ocasionalmente

maculada, porém, a Companhia continua impávida sua marcha, armada com seu famoso

produto — para estabelecer a presença global.

Provocante, controvertido e sempre divertido, Por Deus, Pela Pátria e Pela Coca-Cola

revela como a Coke transformou irreversivelmente nosso mundo. Como saga familiar, história

cultural e, finalmente, história completa de um ícone americano, este livro é "Emoção Pra

Valer".

O AUTOR

Natural de Atlanta, Mark Pendergrast cresceu na West Paces Ferry Road, mais conhecida

como "O Beco da Coca-Cola" e formou-se em Harvard. Jornalista especializado em temas

empresariais, reside atualmente em Stowe, Vermont.

O mundo dos negócios tem seu Romance. A história secreta de todos os grandes sucessos empresariais é tão emocionante quanto a história mais imaginosa que se possa contar. O verdadeiro sucesso jamais cai do céu... O progresso se consegue com luta constante e trabalho árduo e paciente. Exige recursos e engenhosidade da mais alta ordem, coragem que não aceita der- rota, resistência que vence oposição, confiança que repele calúnia invejosa. E essa tem sido a história da Coca-Cola.THE ROMANCE OF COCA-COLA (folheto) 21 DE MAIO DE 1942 Desde 1886... mudanças tem sido a ordem do dia, do mês, do ano. Essas mudanças, poderíamos acrescentar, foram no todo ou em parte resultado da própria existência da The Coca-Cola Company e de seu produto... Elas cri- aram satisfação, deram prazer, inspiraram imitadores, deixaram patifes intrigados... Coca-Cola não é um artigo essencial, como gostaríamos que fosse. É uma idéiaé um símboloé uma marca inspirada pelo gênio. — Carta do publicitário William C. D'Arcy 24 DE MARÇO DE 1959 Por favor, Sr. Kahn, o senhor escreveu excelentes artigos e perfis, mas por que todo esse trabalho com a Coca-Cola? Não posso conceber que ela seja tão interessante, e para tantas pessoas, que o leve a usar todo esse papel, milhares de palavras e horas de trabalho. Além disso, considero-a uma bebida extremamente nociva. — Carta a E. J. Kahn, Jr., como reação a uma série de artigos sobre a Coca-Cola, publicados no T HE NEW Y ORKER 10 DE JULHO DE 1985 Por que ler ficção? Por que ir ao cinema? A indústria de refrigerantes tem mergulhos de montanha-russa suficientes para fazer romancistas babarem de prazer. — Jesse Meyers, na edição especial da BEVERAGE DIGEST, que anunciava a volta da Coca-Cola original.

Sumário

Agradecimentos É difícil saber por onde começar a manifestar minha gratidão a todas as pessoas que tornaram possível este livro. Em primeiro lugar, tenho que agradecer a Phil Mooney, Joanne Newmann e Laura Jester, do Coca-Cola Archives, por me permitirem acesso à coleção privada, em geral vedada ao público. A assistência e o discernimento dessas pessoas tornaram o texto realmente viável. Eu havia sido informado de que era impossível tratar com funcionários da The Coca-Cola Company — "desconfiados" e "paranóicos" eram as palavras mais freqüentemente usadas para designá-los. Muito ao contrário, mostraram-se corteses e acessíveis ao se convencerem de que me dispunha a escrever um livro de funda pesquisa e objetivo. Assim, não posso agradecer como gostaria a todos os empregados da Coca-Cola, em atividade e aposentados, que conversaram comigo por tanto tempo e com tão grande boa vontade. São eles listados ao fim deste livro, na seção de entrevistas da Bibliografia. Mas gostaria de agradecer particularmente a Joe Jones por suas intuições sobre a personalidade de Robert Woodruff e a Charlie Bottoms por suas respostas prontas e imediatas. É também grande minha dívida com Claus Halle, pelas muitas conversas e pelos contatos. Na McCann-Erickson, a primeira agência de publicidade da Coke, John Bergin prestou-me serviço semelhante. O engarrafador de Kentucky, Bill Schmidt, e sua esposa, Jan, colocaram à minha disposição seu excelente museu sobre a Coca-Cola com novidades e "folclore" de seus arrastados processos judiciais com a companhia. O advogado de ambos, Emmet Bondurant, em espaço de seu escritório, facilitou-me copiar pastas de minutas de processos legais não vedados ao público. O King & Spalding, principal escritório de advocacia da The Coca-Cola Company, mostrou-se também prestativo. Descobri que Linda Matthews e suas bibliotecárias (Ellen Nemhauser, Beverly Bishop, Kathy Knox), da Special Collections da Robert W. Woodruff Library, na Emory University, estavam ansiosas para ajudar-me no projeto e, nesse sentido, trouxeram-me caixas e caixas à mesa de trabalho. Outras bibliotecas e bibliotecários fizeram mais do que se poderia esperar no cumprimento do dever, incluindo Julie Pickett, da Stowe Public Library, em Stowe, Ver-

10 POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

mont, Sue Miller, da Brownell Public Library, em Essex Junction, Vermont, Joyce Miller e Mara Siegel, da Trinity College Library, em Berlington, Vermont, e Mark McAteer e Diane Boisnier, na St. Michael's College Library, em Cochester, Vermont. Realizei pesquisas também na Atlanta Historical Society, Fulton County Superior Court, Benwood Foundation, em Chat-tanooga, na Bailey Howe Library, na University of Vermont, na University of North Carolina Library, no Center for Advertising History, na Smithsonian, na Biblioteca do Congresso, na Baker Library, na Harvard Business School — e em todas essas instituições recebi assistência capaz e profissional. Jesse Meyers, editor da Beverage Digest, brindou-me não só com uma perspectiva de pessoas que tiveram acesso a informações sigilosas da indústria, mas abriu-me também as coleções de sua revista e folhetos relativos a seminários. Tive a grande sorte de localizar a Sra. Ernestine Sherman, sobrinha neta de John Pemberton. Apesar de suas apreensões e de sua saúde frágil, desvendou um tesouro de cartas e documentos familiares de valor inestimável para a reavaliação do legado de Pemberton. O mesmo se aplica a Monroe King e ao seu autonomeado "Pemberton Archives". Durante anos, King colecionou sistematicamente documentos secretos sobre Pemberton, e seus esclarecimentos foram vitais para que eu pudesse compreender o inventor. Frank Robinson II, o tataraneto do homem que deu nome à Coca-Cola, mostrou-se generoso em tempo e conhecimentos, e forneceu-me pista decisiva sobre a quantidade de cocaína na Coca-Cola original. Meus contratos através do Coca-Cola Collectors Club Internacional foram extremamente úteis. Bill Bateman e Randy Schaeffer, dois professores de informática da Pennsylvania, pesquisaram laboriosamente coisas e fatos memoráveis, e a história por trás dos mesmos, em uma série de artigos publicados no jornalzinho do clube. Tiveram a bondade de ajudar-me em todos os casos em que lhes solicitei informação específica. Thom Thompson, um arquiteto de Kentucky, passou tempos inacreditáveis numa máquina de fotocópia, enviando-me muito material interessante e compartilhando comigo na compreensão dos fatos notáveis sobre os maníacos pelas relíquias da Coca-Cola. Meu trabalho vem na trilha de livros anteriores sobre a Coca-Cola, de autoria de E.J. Kahn, Jr., Brad Ansley, Hunter Bell, Franklin Garrett, Lawrence Dietz, Sanders Rowland, Pat Roddy, Jr., Pat Watters, J.C Louis, Harvey Yazijian, Henry Frundt, Richard S. Tedlow, Anne Hoy, e Thomas Oliver. Confesso-me em débito pessoal com E.J. Kahn, Jr., pelo seu estímulo espírito humanitário. No início, me permitiu pesquisar-lhe os arquivos da The New Yorker e copiar mais de 400 páginas de notas meticulosamente indexadas, que me deram informações concretas e serviram como modelo exemplar. Brad Ansley, que escreveu a biografia de Asa Chandler publicada sob nome de outrem, deu-me várias informações sobre os antecedentes dos Candlers. Não conheci Hunter Bell, mas sua história inédita da Coca-Cola, que faz parte dos arquivos da companhia, merece crédito. Franklin Garrett, que escreveu anonimamente a única história "oficial" da companhia e é uma lendária enciclopédia ambulante sobre Atlanta e o folclore da Coke, teve a bondade de responder às minhas detalhadas perguntas. Pat Watters generosamente pôs à minha disposição sua biblioteca e seus conhecimentos, enquanto Henry Frundt acrescentava detalhes do livro que escreve sobre a Coke na Guatemala. Thomas Oliver falou-me com a maior boa vontade sobre sua experiência recente, pesquisando a história da Nova Coke. Thomas P. Stamps teve a bondade de me permitir usar dados de sua tese de mestrado inédita sobre a Coca-Cola, o que se revestiu de um valor especial, pois Stamps teve acesso à biografia que Harold Martin escreveu sobre Robert Woodruff, antes que fosse decidido fechá-la aos olhos do público. Estudiosos de vários campos contribuíram com conhecimentos especializados e melhor visão dos problemas. Sou particularmente grato a James Harvey Young, maior autoridade mundial em remédios vendidos sem receita e bula, por ter-me dado de seu tempo e conheci-

Notas Sobre o Texto

  1. Virtualmente todos os principais personagens desta história são homens, o que constitui em si um comentário sobre o mundo americano dos negócios nos últimos cem anos. Em conseqüência, resolvi, deliberadamente, referir-me aos homens da Coca-Cola ou aos homens da McCann-Erickson, mesmo que algumas mulheres tenham desempenhado papéis vitais nessas empresas. Ou, como disse em 1957 um executivo da Coke, revelando um machismo inconsciente: "Duas coisas tornaram grande este negócio — a primeira, o produto Coca-Cola e, a segunda, homens. Temos o produto mas precisaremos cada vez mais de bons homens. Homens de caráter e inteligência. Homens que sejam inventivos e esforçados. Homens de coragem e ambição. Homens de dedicação... Vejo um futuro maior, com maior responsabilidade, para um número cada vez maior de homens" (grifos nossos).
    1. Resolvi usar a palavra "negros", em vez da — politicamente correta — expressão mais recente "americanos africanos" ou "gente de cor". Embora sem o desejo de ofender, essas expressões me parecem forçadas. Além do mais, os caucasianos ainda são chamados de "brancos", mesmo que variem do bege ao bronzeado.
  2. Uma vez que este livro não é uma tese de Ph.D., não atravanquei o texto com notas numeradas de rodapé. As fontes de informação são mencionadas ao fim do livro, com referências ao texto. O leitor encontrará nessas notas alguns dos mais divertidos casos e curiosidades sobre a Coca- Cola e material básico esclarecedor, sem que esses suculentos petiscos interrompam o fluxo do texto principal.
  3. Os cinco minidramas que introduzem cada parte são recriações ficcionais de eventos prováveis e como tais devem ser interpretados.
  4. Todos os erros não gramaticais entre aspas são de autoria do personagem original que está sendo citado. Resolvi deixar esse fato consignado aqui, em vez de introduzir a indicação

14 POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

[sic] em tantas citações, Até a página 68, a palavra Coca-Cola é grafada erroneamente ou em

minúsculas. Como Asa Candler objetava a esse costume, corrigi a ortografia para facilitar a

leitura e deixei de fora as aspas, que os homens da companhia gostam de colocar cm torno

de "Coca-Cola". Em sinal de respeito à política histórica da companhia, usei o nome completo

até a página 183, quando o nome "Coke" tomou-se uma marca registrada reconhecida. Daí em

diante, usei indiscriminadamente ambas as palavras.

16 POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

muita coisa em comum, especialmente a capacidade de perseguição monomaníaca de uma meta. Em Por Deus, Pela Pátria e Pela Coca-Cola, Pendergrast realizou com mão de mestre aquilo que muitos de nós já tentamos. Reuniu tudo. Ensinou-me tanto sobre a empresa, que eu julgava conhecer intimamente, que me senti como um colegial saindo de seu primeiro encontro com a namorada. Só posso mesmo deixar-me dominar pela admiração. Algumas pessoas consideram a Coca-Cola uma piada. Pendergrast leva-a merecidamente a sério — ainda que com delicadeza. Porque não há nada que se lhe compare. Nenhuma guerra de verdade foi travada por causa da Coca-Cola (embora suas escaramuças com a Pepsi chegassem quase às lutas armadas), mas a aceitação ou rejeição da bebida produziu efeitos profundos sobre assuntos políticos e econômicos de numerosas nações. A Coca-Cola já em si lembra um país. Em países estrangeiros, seus funcionários desfrutam com freqüência status de embaixador — nas guerras seus agentes uniformizados acompanharam tropas americanas para assegurar um arsenal abarrotado da indispensável Coca-Cola. Em última análise, Mark Pendergrast escreveu não tanto uma história empresarial, mas uma viagem fascinante, microcósmica, de mais de 100 anos de história americana e mundial através do prisma de uma geladíssima garrafa de Coca-Cola. Alguns leitores vão admirar o papel do refrigerante em nossa cultura e psique; outros se mostrarão apavorados. Mas ninguém deixará de ficar impressionado ou, talvez, engolir em seco. Gulp.

Prefácio

Para mim, este livro foi uma espécie de projeto "Raízes". Como ambos os lados de minha

família residiam em Atlanta desde fins do século XIX até o presente, era inevitável que a

Coca-Cola cruzasse muitas vezes nossa vida. Meu avô paterno, J. B. Pendergrast, era dono de

uma farmácia em Little Five Points, onde regularmente servia o refrigerante a Asa Candler,

primeiro magnata da Coca-Cola, antes de investir no Sindicato Woodruff, que assumiu o

controle da companhia em 1919. Infelizmente, J. B. vendeu as ações alguns anos mais tarde,

a fim de construir uma casa. A mais curiosa história de família diz respeito ao dia em que o

jovem Robert W. Woodruff e seu amigo Robert W. Schwab discutiram os encantos de Helen

Kaiser, sentados do lado de fora de sua casa. "Bem", disse Woodruff, "acho que vou propor

casamento a ela agora mesmo", enquanto aguardava um protesto. "Vá em frente", respondeu

Schwab, fingindo desinteresse. Ao voltar minutos depois, Woodruff disse: "Ela me recusou.

Acho que você terá que casar com ela". O que Schwab fez, tornando-se mais tarde meu avô

materno.

Se Woodruff tivesse com ela se casado, eu talvez fosse hoje um homem rico — ou talvez

não estivesse aqui, já que ele, dirigindo os destinos da Coca-Cola de 1923 até sua morte em

1985, não teve filhos. Mas foi bom que as coisas tivessem acontecido dessa maneira, pois

gostei de adotar uma visão mais objetiva da Companhia e de seu divertido papel na história

mundial. E espero que você, leitor, também pense assim.

Mark Pendergrast

22 POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

Coke haviam criado uma nova fórmula que invariavelmente batia a Pepsi — e a Coke, também — nos testes de olhos vendados. Goisueta enfatizou que o tempo estava maduro para a mudança, que, de repente, até passara a época desse lançamento de uma Nova Coke. Simples- mente isso tinha que ser feito. O homem mais jovem calou-se à espera da reação do velho. O charuto permaneceu imóvel. Os olhos brilhavam. Do outro lado da janela, no primeiro dia do novo ano, caía uma chuva fina. Lentamente os olhos de Woodruff encheram-se de lágrimas, o charuto tremeu. Pontinhos de poeira vibravam no silêncio, na réstea de luz que vinha da janela. O Chefe finalmente suspirou. "Faça," disse em voz áspera, e os olhos transbordaram. Goizueta sorriu. Woodruff sempre gostara dele e o escolhera seu sucessor. Costumavam almoçar juntos, havia entre eles um laço, um entendimento especial. Era importante essa aprovação do Chefe. Dizia-se que o velho odiava mudança, mas Goizueta sabia que ele precisava das coisas bem explicadas, em termos simples. Aquilo era exatamente igual a Diet Coke e vejam só que sucesso fora. Goizueta agradeceu, disse que logo voltaria e deixou o quarto. Roberto era convincente, não tanto por fatos e números, mas pelo entusiasmo. Devia estar certo, e isso não significava que o Chefe tivesse que viver para ver sua fórmula secreta modificada. O velho deixara de alimentar-se. Dois meses depois, um antes da Nova Coke ser anunciada, Robert Woodruff morreu. Não soube do tumulto que a mudança de sabor provo-caria. Mas não é difícil imaginar que em alguma parte, em um cérebro que funcionava ativa-mente, ele fizesse um palpite. Durante três meses, a obstinada direção da Coca-Cola foi bombardeada por milhares de telefonemas e centenas de quilos de cartas, súplicas pela volta da velha bebida. Na imprensa, não havia mais espaço para as indignadas reações do público. Goizueta esperava que a comoção amainasse, e ela só fazia aumentar. Ficou claro que o cubano e sua equipe administrativa, com suas pesquisas de mercado e seus publicitários, haviam cometido um erro de cálculo. O gosto não era o problema. Era de pouca importância que a Nova Coke descesse suavemente garganta abaixo. As cartas, que estranhamente lembravam outras enviadas à companhia por pracinhas durante a II Guerra Mundial, detalhavam claramente o verdadeiro problema. A Coca-Cola era uma velha amiga, uma parte do cotidiano, um talismã da América, um ícone. Mas ao contrário das cartas do tempo da guerra, que manifestavam profunda gratidão, essas mostravam pessoas que se julgavam traídas: "Mudar a Coke é como se Deus desse à grama a cor púrpura." "Acho que não ficaria mais chocado se vocês queimassem a bandeira em frente a nossa casa." Roberto Goizueta e sua equipe aprenderam uma rápida e incisiva lição comercial e final-mente jogaram a toalha, trazendo de volta a velha Coke a um mundo agradecido. O problema não era de gosto. O problema não eram pesquisas de mercado ou grupos selecionados. O problema era Deus. O problema era Pátria. O problema era Coca-Cola.

Parte I No Começo (1886-1899)

Dia quente, agosto de 1885. O homem alto e barbudo hesitou ao cruzar a Marietta Street, uma das ruas de maior movimento em Atlanta. Cava-los e charretes tiravam sons metálicos das lajes; prósperos homens de negócios circulavam apressadamente. Mulheres elegantemente vestidas, protegidas por sombrinhas, dirigiam-se em passos lentos para a Jacobs' Pharmacy, na esquina, tomar um ice cream soda. Pequenos jornaleiros aos berros anunciavam jornais: "Leiam, leiam! A Quadrilha do Uísque Combate o Imposto sobre o Pecado! Trabalha- dores Pró-temperança se Reúnem! Um Fracasso o Discurso Contra a Lei Seca no Teatro da Opera! Leiam. Não percam!" "Eu fico com um jornal, filho." Contraindo os lábios, esquecendo momentaneamente a rua movimentada, o homem leu a matéria. Encontrou o sensacionalismo habitual. Um suicídio na cidade. Uma tentativa de linchamento. O nascimento de triplos. Folheou o jornal, impaciente. Ah, ali estava um editorial tratando da licença de bebidas alcoólicas para venda. "A licença é culpada, diante do tribunal de Deus e da humanidade, desse grande cri-me: cria, fomenta, atrai, incita, estimula e multiplica a intemperança. O bar aberto leva o copo de uísque aos lábios de todos os homens, em todas as esquinas.' Nenhuma dúvida a esse respeito. Atlanta apoiaria a Lei Seca. Era apenas uma questão de tempo. A rua esvaziou-se momentaneamente. Co-locando o jornal dobrado sob o braço, o idoso cavalheiro cruzou a rua antes que outra charrete aparecesse na esquina. No momento em que enfiava a chave na fechadura da porta do número 107 da Marietta Street, um jovem, ao passar, num cumprimento, levantou vivamente o chapéu. "Bom-dia, Dr. Pemberton. Calor de rachar, não?" O idoso cavalheiro sorriu incli-

A Cápsula do Tempo: A Idade de Ouro do

Charlatanismo

Estive fazendo experimentos com um pequeno preparadouma espécie de devoção composta de nove décimos de água e um décimo de drogas que não podem custar mais de um dólar o barril... No terceiro ano, poderíamos facilmente vender 1. 000.000 de garrafas nos Estados Unidoscom lucros de pelo menos $350.000e, em seguida, chegaria a hora de concentrara atenção na idéia real do negócio... Nossa sede seria em Constantinopla e nossas instalações na ainda mais distante Índia!... Nossa renda anual... bem, só Deus sabe quantos milhões e milhões! — Coronel Beriah Sellers, no The Golden Age, 1873, de Mark Twain NÃO HA DÚVIDA de que The Coca-Cola Company adora sua história. Para provar isso, em 1990, gastou US$ 15 milhões no seu museu de Atlanta, que doutrina diariamente mais de 3.000 turistas encharcados de Coca-Cola com a versão de seu passado em alta tecnologia. No dia da inauguração, as notas de imprensa descreviam o museu como uma "terra de fantasia". De várias maneiras, o museu é justamente isso. Os jovens e elegantes guias vestidos de vermelho garantem, por exemplo, que a Coca-Cola jamais conteve cocaína. O museu preserva a velha tradição da companhia. A saga da Coca-Cola vem sendo mantida e alimentada reverentemente durante anos. Na versão oficial, a história da criação da Coca-Cola, em 1886, exibe todas as características do clássico mito americano do sucesso, no exemplo dos protagonistas dos romances de Horatio Alger, Esses heróis, que serviram de modelo para esperançosos jovens capitalistas, foram catapultados na Idade de Ouro para a riqueza espantosa, a partir de origens humildes, e graças à perseverança, ao trabalho árduo e a um inevitável golpe de sorte. John Pemberton, o inventor da Coca-Cola, é assim descrito pela Companhia como um pobre e estimável velho médico de roça, que por acaso descobriu a nova e milagrosa bebida. Apesar da Coca-Cola ter supostamente nascido num humilde caldeirão montado sobre um tripé, no quintal de Pemberton, e não numa manjedoura, a história é tratada como uma espécie de Parto Virginal. Wilbur Kurtz, primeiro historiador da Coca-Cola, descreve o momento: "Ele se curvou sobre o caldeirão para cheirar a infusão. Com uma comprida colher de pau, retirou da panela um pouco do espesso conteúdo marrom, borbulhante, e esperou que esfriasse. Levou a colher aos lábios e provou." O trabalho árduo e a perseverança de Pemberton para chegar ao gosto certo deram por fim resultado — como nas histórias de Alger, graças a um acaso feliz —, o xarope foi misturado acidentalmente com água gaseificada, em vez de água pura. Os fregueses adoraram a bebida efervescente, estalando os lábios de satisfação. Depois disso, de acordo com a lenda da Companhia, garantira-se o futuro da bebida. Ela, claro, precisava de uma pequena ajuda de Asa Candler, que comprou a fórmula ao moribundo Pemberton, divulgou-a amplamente, e, num abrir e fechar de olhos, tornou-se o homem mais

26 POR DEUS, PELA PÁTRIA E PELA COCA-COLA

rico de Atlanta. Em princípios da década de 1900, o sucesso da bebida era repetidamente chamado de "o romance da Coca-Cola". Mas essa versão oficial dos fatos é um mito. John Pemberton não era um ignorante médico de roça. Não cozinhou a bebida no quintal. Mais importante que tudo, longe de ser a única bebida saída do nada, a Coca-Cola foi produto de um tempo, de um lugar e de uma cultura. E, como tantas outras panacéias, era um medicamento de fórmula secreta, com o claro efeito estimulante da cocaína. Um dos elementos do mito, porém, é verdadeiro. As possibilidades de sucesso da Coca-Cola eram tão remotas como a "decocção" do coronel Sellers. O trecho de Twain, no entanto, era uma profecia sobrenaturalmente exata sobre o futuro da Coca-Cola. A Coke é hoje o produto de maior distribuição mundial, circulando em mais de 185 países, mais que a filiação às Nações Unidas. Com exceção do "OK", "Coca-Cola" é a palavra universalmente mais reconhecida e a sua bebida tornou- se um símbolo do estilo ocidental de vida. Como, em pouco mais de um século, um líquido efervescente que contém 99% de água açucarada pôde conseguir esse espantoso status? As condições reinantes na América de fins do século XIX determinaram-lhe decisivamente o futuro. UMA NAÇÃO DE NEURÓTICOS Durante a Idade de Ouro, a metamorfose por que passou a América, de uma terra de agricultores em sociedade, para uma sociedade urbanizada de usinas e fábricas, foi, e há provas disso, uma das mais torturantes de sua história. Tendo a Guerra Civil como ponto decisivo e catalisador, o industrialismo e uma virtual revolução nos transportes assinalaram a emergência de um tipo caracteristicamente americano de capitalismo — um capitalismo que idealizava a iniciativa individual e confiava fortemente na publicidade e nos jornais para propagar-lhe o evangelho. A estrada de ferro tornou-se o símbolo e o motor de uma profunda mudança, permitindo a criação de mercados nacionais. O ritmo alucinante provocou o medo de uma nova doença, caracterizada por sintomas neuróticos, psicossomáticos. Um autor dessa época diagnosticou-a como fruto de "uma idade industrial e competitiva". Atualmente, nós a chamamos de "O Choque do Futuro", embora George Beard a tivesse chamado de "neurastenia", em seu livro de 1881, American Nervousness, Its Causes and Consequences* Beard atribuiu a nova doença às perturbações produzidas, social e economicamente, pela "civilização moderna". O motor a vapor, notou Beard, que supostamente facilitaria o trabalho, criara, ao contrário, estilos de vida mais frenéticos e excesso de especialização, "deprimindo corpo e mente", Observou também que uma América mais consciente estava tornando-se mais obsessiva: "A pontualidade é uma grande ladra de força nervosa." De um modo geral, disse ainda Beard, o excesso de trabalho, a tensão das altas e baixas econômicas, a repressão de emoções violentas e o excesso de liberdade de pensamento contribuíam para estados profundos de nervosismo. E finalmente, "a rapidez com que novas verdades são descobertas, aceitas e popularizadas nos tempos modernos constitui prova e resultado da extravagância de nossa civilização".

  • Curiosamente, ter um diagnóstico de neurastenia era considerado sinal de boa criação e alto status social. Só os temperamentos refinados, delicados, ou cérebros altamente solicitados estavam sujeitos à doença. Beard chegou à conclusão de que o trabalhador braçal era ignorante demais e cheio de saúde demais para ser afetado. A cura de neurastênicos como Theodore Roosevelt, por exemplo, consistia em ar fresco e atividade física, muitas vezes em ranchos no Oeste para turistas. Mulheres como Charlotte Perkins Gilman ou Edith Wharton, por outro lado, eram reduzidas à passividade completa e alimentadas no leito com colheradas de leite.