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Um estudo sobre a política nacional de promoção da saúde no brasil, analisando seus antecedentes, o movimento da promoção da saúde e as reflexões sobre o conceito ampliado de saúde, direito à saúde e o papel do estado na garantia da saúde. O texto busca identificar as origens, principais propostas e tendências da promoção da saúde no brasil, além de observá-lo no contexto institucional precedente à promulgação da pnps.
O que você vai aprender
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Não perca as partes importantes!
Rio de Janeiro Dezembro – 2009
Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Políticas Públicas e Formação Humana
Orientadora: Profa. Dra Marise Nogueira Ramos Co-orientador: Prof. Dr. José Luiz Telles de Almeida
Rio de Janeiro Dezembro - 2009
Aos meus pais, Henrique Gomes (in memorian) e Nancy de Lima Gomes que sempre incentivaram os seus filhos a buscar na educação uma fonte contínua de crescimento pessoal e profissional.
A minha orientadora Marise Ramos, pela paciência, carinho e compreensão ao longo de todo esse processo, ao amigo e co-orientador José Luiz Telles pelo incentivo e paciência nesse período.
Ao professor e amigo, Victor Vicent Valla (in memorian), que sempre me incentivou para fazer o mestrado e que em 2001 seria o meu orientador, mas pelas escolhas que a vida nos impõem, tive naquele momento, que optar pela gestão da Secretaria de Saúde de Valença, o que impossibilitou esse caminho conjunto. Muito obrigado Valla por ter sempre acreditado no meu potencial, cheguei lá, um grande abraço amigo.
Gomes, Mauro de Lima – Política Nacional de Promoção da Saúde: Potência de Transformação ou Política Secundária. 2009. 88f. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana – Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
Este estudo analisa, a partir de levantamento bibliográfico e documental, a Política Nacional de Promoção da Saúde, mediante a análise de seus antecedentes, do estudo do movimento da promoção da saúde e das reflexões acerca do conceito ampliado de saúde, do direito à saúde e do papel do Estado na garantia da saúde, buscando elementos que possam subsidiar a sua compreensão. Busca também, através do estudo da implementação da PNPS, identificar quais as ações mais priorizadas por essa política, assim como analisar o seu texto fundante, relacionando-o com as ações propostas pela sua agenda inicial. Pretende-se identificar os possíveis aspectos potencializadores da PNPS frente ao fortalecimento do SUS e, em que medida essa política se coloca como uma potência de fortalecimento desse sistema, ou como uma política secundária face às suas limitações e contexto atual do SUS, considerando a contradição entre um Estado neoliberal e as políticas públicas no campo social como a PNPS.
Palavras-Chave: Promoção da Saúde, Política Pública, Sistema Único de Saúde.
ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária CAPs – Caixa de Aposentadorias e Pensões CEPEDOC – Centro de Estudos,Pesquisas e Documentação em Cidades Saudáveis
CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira CGDANT – Coordenação Geral das Doenças e Agravos Não Transmissíveis CDC – Centers for Disease Control/Atlanta-USA CONASS – Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde CONASEMS – Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde CNDSS – Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais em Saúde CSDH – Commission on Social Determinants of Health DCNT – Doenças Crônico Não Transmissíveis DGSP – Diretoria Geral de Saúde Pública EPSJV – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio FMI – Fundo Monetário Internacional FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz FUNASA – Fundação Nacional de Saúde INCA – Instituto Nacional do Câncer IAPs – Instituto de Aposentadorias e Pensões MS – Ministério da Saúde
MCS – Municípios e Comunidades Saudáveis
OMS – Organização Mundial de Saúde OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde
PAETEC – Programa de Apoio ao Ensino Técnico
PIB – Produto Interno Bruto
PNPS – Política Nacional de Promoção da Saúde
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SAS – Secretaria de Atenção à Saúde
SCTIE – Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos
SGETS – Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde
SGEP – Secretaria de Gestão Participativa
SPS – Secretaria de Políticas de Saúde
SVS – Secretaria de Vigilância em Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
Introdução
A discussão da saúde em nosso país remete a algumas ponderações importantes no sentido de perceber essa questão numa forma mais aproximada de sua totalidade. Isso implica na abordagem de algumas mediações que interferem na sua concepção, no reconhecimento da mesma como um direito e na organização de políticas por parte do Estado para fazer face às necessidades de saúde de seus cidadãos.
O entendimento do que é saúde pela sua própria negação, ou seja, pela doença, além de ser uma prática usual, acaba limitando a sua concepção. Essa redução tem implicações na própria forma como se organiza a atenção à saúde em nosso país, mais centrada nas ações voltadas para o atendimento das doenças.
Uma concepção ampliada do que seja saúde, conforme a anotada pela legislação federal aponta a correlação direta da saúde com fatores determinantes e condicionantes, como a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso a bens e serviços essenciais, entre outros (Brasil, 1990).
A conquista legal de uma concepção ampliada de saúde e a própria criação do Sistema Único de Saúde (SUS), na realidade não podem ser entendidas sem uma análise de sua historicidade, o que possibilita observar de forma mais clara algumas contradições que se impõem hoje na discussão de políticas públicas de saúde.
Desde o regime militar, nas décadas de 1960 e 1970, acentuou-se o reforço do modelo médico-curativo pela demanda social por consultas médicas como respostas às graves condições de saúde da população. A medicina, dessa forma, era encarada como sinônimo de cura e restabelecimento da saúde individual.
A consolidação desse modelo ocorreu com um forte financiamento público a partir da previdência social que financiou clínicas e hospitais privados a fundo perdido, aliado a forte expansão de faculdades de medicinas particulares em todo o país, voltadas para especialização, para a sofisticação tecnológica e as últimas descobertas da indústria farmacêutica e de equipamentos médico-hospitalares. Esse incentivo à medicina curativa, neste período, ocorreu em detrimento dos recursos destinados aos serviços públicos (Escorel, 2005 e Luz apud Brasil, 2005).
Observa-se, dessa forma, a expansão de uma grande área do capital, sendo que financiada em grande parte pelo setor público - o Estado - demarcando um determinado modelo de atenção à saúde. Nos anos 80, com a expansão do ideário neoliberal, a conseqüência para o Brasil e América Latina foi um alinhamento a receituários impostos por organismos internacionais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), com forte restrição nos investimentos públicos por conta do ajuste econômico necessário à estabilidade pretendida, que fez com que houvesse um grande desajuste nos países latinos (Soares, 2001, e Fiori, 2002). Observamos, porém, nessa mesma década de 80, todo um crescimento e consolidação do movimento da reforma sanitária brasileira, que influenciou, junto com a forte participação da população civil organizada, a VIII Conferência Nacional de Saúde, conseguindo mobilizar mais de 4.000 delegados em 1986. Essa Conferência acabou sendo decisiva nas articulações posteriores quando da instalação da Assembléia Nacional Constituinte – responsável pela construção e aprovação da Constituição de 1988 - denominada Constituição Cidadã. Inúmeros avanços sociais foram alcançados em seu texto, como o próprio capítulo da saúde e a constituição do Sistema Único de Saúde (Brasil, 1987; Escorel; 2005, Brasil, 2006). Os avanços legais em relação à saúde presentes na Constituição de 1988, com o reconhecimento do direito à saúde do cidadão e o dever do Estado; e com a criação do SUS
(^1) A Emenda Constitucional 29 teve a sua regulamentação aprovada pela Câmara dos Deputados em 2007, mas ainda aguarda a regulamentação no Senado, sendo pela proposta da Câmara, fixado aos Estados e Municípios um percentual de repasse de impostos arrecadados para a área de saúde – de 12% e 15% respectivamente, sendo que a União vinculará o aumento anual dos recursos para a saúde à variação do Produto Interno Bruto.
Essa preocupação que eu já possuía e que foi potencializada, do não afastamento da realidade social, fez com que eu optasse por uma dupla inserção, a saber: no mundo acadêmico na Fiocruz e na realidade dos serviços de saúde. Isso fez com que, a partir de 1990, ingressasse na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) como professor e posteriormente pesquisador ligado ao Programa de Apoio ao Ensino Técnico (PAETEC) ao mesmo tempo em que exercia atividades de sanitarista na Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, mais especificamente no Centro de Saúde de Irajá.
Permaneci ligado à EPSJV, mas a partir de 1993, com o nascimento da minha primogênita fiz uma opção de morar no interior do Estado do Rio, no município de Valença, onde comecei a atuar no SUS dentro de outra realidade demográfica social, devido à população de cerca de 70 mil habitantes e das características de um município do interior.
A inserção em Valença, como técnico - coordenador da vigilância epidemiológica e sanitária - e depois nos anos de 2001 e 2002 como Secretário de Saúde deste município, me colocaram inúmeras situações nas quais claramente se demonstrava a necessidade de potencializar ações direcionadas à população que pudessem contribuir com a sua qualidade de vida e saúde. Contudo, não se deixou de reconhecer à necessidade de se trabalhar a resolução de atendimento assistencial, pois, a população adoecida necessita de um atendimento imediato.
As dificuldades em relação ao financiamento de ações de promoção da saúde eram grandes devido à falta de apoio a projetos específicos nessa área, o que era um reflexo da não existência de uma política de promoção da saúde. Aliado a isto, havia a dificuldade da ordenação de despesas de uma secretaria de saúde, onde as fontes de financiamentos eram vinculadas diretamente a programas, dificultando ou impedindo completamente a realocação de recursos.
Observo, através das leituras iniciais sobre a PNPS e a própria proposta da promoção da saúde, potencial no sentido de reconhecimento pela população de que a saúde é um direito social do cidadão e, portanto, não pode ser reduzida a uma mercadoria. É necessário que o Estado assuma seu papel constitucional, o que é visto hoje em dia com restrições, devido ao avanço significativo da saúde privada consoante com o pensamento naturalizador de que cabe ao Estado regular e focalizar ações sociais para quem não tenha condições de recorrer “ao mercado”.
Mas como investigar um dado fenômeno (PNPS) de forma intensa e não permanecer na superficialidade, na sua aparência, mas buscar a sua essência? Neste sentido, para desenvolver a investigação sobre a formulação da PNPS e definir a problemática a ser enfrentada, parto de uma opção metodológica de se trabalhar com os elementos da dialética materialista histórica enquanto um método de análise que possa permitir uma apreensão radical (que vai à raiz) da realidade e, enquanto práxis, isto é, unidade de teoria e prática na busca de transformação e de novas sínteses no plano do conhecimento e no plano da realidade histórica (Frigotto, 2006).
Dessa forma, busco não só entender o fenômeno, mas contribuir na produção e difusão de um conhecimento interessado e compromissado com um desenvolvimento social, no caso da saúde, e de uma emancipação de uma população em relação ao “pensamento único” privatista de tudo, inclusive de um direito fundamental e necessário para o andar da vida.
Para a realização dessa pesquisa, busquei junto aos estudos teóricos de revisão bibliográfica os elementos para o entendimento da proposta da promoção da saúde. Também os seus antecedentes, a própria formulação da política e sua implementação, foram possíveis de serem investigadas através da consulta de documentos oficiais.
A organização dos capítulos da dissertação buscou construir um caminho organizado que auxiliasse no entendimento da PNPS. Nesse sentido, no primeiro capítulo, busquei os elementos teóricos que julguei importantes para dar base para a discussão da PNPS, a partir de uma concepção ampla do que seja saúde, a relação desenvolvida no Brasil entre o Estado e a saúde e a configuração desta como um direito do cidadão.
No segundo capítulo, busquei analisar os antecedentes dessa política, tanto do ponto de vista do movimento internacional da promoção da saúde, como de sua institucionalização no Ministério da Saúde, além da análise do próprio texto da PNPS.
No terceiro capítulo, observo a implementação inicial dessa política, buscando os elementos iniciais de discussão da PNPS. Finalizo, em minhas conclusões, apontando que a questão central em relação à potencialidade dessa política, passa pela capacidade que ela possa ter de estar ampliando a consciência sanitária da sociedade civil, na direção de um reconhecimento da saúde, em sua concepção ampla, e do SUS como conquistas de direitos que devem ser exercidos plenamente, necessitando para tal de um Estado que possa
Não é nossa intenção fazer uma revisão dos conceitos de saúde ao longo da história, e sim apontar que ocorrem variações nesse conceito, ora aproximando-o aos determinantes sociais de condições de vida e trabalho, ora relacionado-o mais estritamente a fatores biológicos. A relação entre o surgimento de doenças e as condições de vida é explicitada mais especificamente no século XVIII, quando as mudanças nas cidades européias ganhavam destaque pelas aglomerações e condições de vida precárias a que estavam submetidas grandes parcelas da população. Foi-se percebendo que as causas das doenças estavam relacionadas às formas de vida.
No final do século XVIII, após a Revolução Francesa, no contexto da crescente reurbanização dos países europeus e da consolidação do sistema fabril, aparece, com força crescente, a concepção de causação social, isto é, das relações entre as condições de trabalho das populações e o aparecimento de doenças. Ao lado das condições objetivas de existência, o desenvolvimento teórico das ciências sociais permitiu, no final do século XVIII, a elaboração de uma teoria social da Medicina. O ambiente, origem de todas as causas de doenças, deixa, momentaneamente, de ser natural para revestir-se de social. É nas condições de vida e trabalho do homem que as causas das doenças devem ser buscadas. (Gutierrez & Oberdiek, 2001, p.20)
Nesse sentido, podemos observar nos séculos XVIII e XIX na Europa, mais especificamente na Alemanha, França e Inglaterra, a formação da medicina social, com a distinção de três fases. Essas fazes são, segundo Foucault, a “medicina de Estado”, surgida na Alemanha do século XVIII, tendo como característica a organização de um sistema de observação da morbidade, a subordinação dos médicos a uma administração central e a integração desses profissionais em uma organização médico estatal; e a “medicina urbana”, com seus métodos de vigilância e hospitalização, sendo um aperfeiçoamento do esquema político médico da quarentena. Surgida na França, a higiene urbana tinha como preocupação central a análise das regiões de aglomeração que significassem ameaça à saúde, como os cemitérios e matadouros, propondo sua re-localização e o controle da circulação do ar e água. Por fim, com o desenvolvimento do proletariado industrial na Inglaterra, a medicina inglesa torna-se social através da ´lei dos pobres`. Caracterizada pela assistência e controle autoritário dos pobres, a implantação de um cordão sanitário que impunha o controle do corpo da classe trabalhadora por meio da vacinação, do registro das doenças e do controle dos lugares insalubres, visa torná-la mais apta ao trabalho e menos perigosa para as classes ricas. (Foucault apud Batistella, 2007).
A organização da medicina, além de trazer a figura do Estado como o responsável maior pela assistência à saúde para a população através de diferentes iniciativas, como as assinaladas acima, também tem uma relação intrínseca com o desenvolvimento do capitalismo, conforme aponta Gomes, a partir da obra de Navarro (1986). Segundo esse autor, a medicina se articula à reprodução da ideologia do capitalismo (liberalismo e individualismo) de duas formas. Uma delas, ao considerar a doença um desequilíbrio entre os componentes de um corpo, corpo esse comparado a uma máquina. A outra forma de reproduzir a ideologia capitalista pela medicina é atribuir a causa das enfermidades aos fatores individuais;
Numa época em que a maior parte das enfermidades estava determinada socialmente devido às condições existentes no capitalismo nascente (conforme relatou Engels em ‘The condition of the working class in England’) uma ideologia que encara o ‘defeito’ constituído pela enfermidade como originário do indivíduo e que dava ênfase a uma resposta terapêutica individual, é obvio que absolveria o meio ambiente econômico e político da responsabilidade na gênese da enfermidade e canalizaria a resposta potencial e a rebelião contra este ambiente para nível individual, que era menos ameaçador. (Navarro, 1986, p: 125 e 126 apud Silva Junior, 1998).
Percebe-se, até agora, a relação existente entre o surgimento do capitalismo, e o impacto que o processo de industrialização acabou causando nas cidades européias, com implicações diretas à saúde da população, principalmente pela precária condição de vida a que essa população era exposta, bem como a fragilidade das cidades nos seus aspectos sanitários. A compreensão da doença, portanto, esteve ligada às condições de vida da população, porém essa concepção sofreu um revés importante quando do desenvolvimento da microbiologia e da bacteriologia, que provocou profundas mudanças na compreensão das causas das doenças;
Na década de 1860 e subseqüentes, a era bacteriológica se instaura com a decisiva participação, entre outros, de Louis Pasteur e Robert Koch, o primeiro evidenciando o papel das bactérias, seja no processo de fermentação, seja nas doenças, além de, entre outras contribuições, e o segundo, tendo descoberto o agente etiológico da tuberculose e formulado os postulados que tipificam o rigor do raciocínio mecanicista e sua insistência na correlação causa-efeito... A teoria microbiana passa a ter já nos fins do século XIX uma predominância de tal ordem que, em boa medida, faz obscurecer concepções que destacavam a multicausalidade das doenças ou que proclamavam a decisiva participação, na eclosão das mesmas dos fatores de ordem socioeconômica. (Barros, 2002)
Essa alternância na concepção de saúde e doença, ora compreendida como ligada às condições sociais, mas depois subsumida pelo desenvolvimento das ciências, quando as causas das doenças eram explicadas pela resposta do organismo à invasão de um
crescente da natureza biológica das doenças e de suas causas e conseqüências, excluindo os determinantes econômicos e sociais da causação das doenças; o individualismo – o indivíduo é eleito como o objeto da medicina científica, alienando-o de sua vida e de seus aspectos sociais; a especialização – o mecanicismo induziu o aprofundamento do conhecimento científico, levando à procura cada vez maior do conhecimento sobre as partes; a exclusão das práticas alternativas – a medicina cientifica impôs-se sobre as outras práticas médicas, acadêmicas e populares, construindo-se um mito da eficácia, “cientificamente comprovada”, de suas práticas, anulando-se ou se restringindo as outras alternativas, tidas como “ineficazes”; a tecnificação do ato médico – o advento da concepção flexneriana, na medicina, estruturou uma nova forma de mediação entre o homem e as doenças, qual seja, a tecnificação do ato médico. A necessidade de técnicas e equipamentos para a investigação diagnóstica e para a terapêutica desenvolveu a engenharia biomédica e gerou muitas expectativas na população quanto à possibilidade de a medicina produzir melhorias na qualidade de vida. (Silva Junior, 1998) Mas o que seria saúde? A sua difícil conceituação advém do fato de que não podemos reduzir a mesma à simples ausência de doenças, mas sim partir para uma conceituação mais ampla. Essa questão de conceituação da saúde também sofre tensões entre visões distintas. Aquelas que querem relacioná-la a condições gerais de vida sofrem críticas de outras correntes que querem relacionar a doença a alterações no organismo humano.
O conceito da OMS, divulgado na carta de princípios de sete de abril de 1948(desde então o Dia Mundial da Saúde),..., diz que “Saúde é o estado de completo bem estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade”... A amplitude do conceito da OMS acarretou críticas, algumas de natureza técnica (a saúde seria algo ideal, inatingível; a definição não pode ser usada como objetivo pelos serviços de saúde), outras de natureza política, libertária: o conceito permitiria abusos por parte do Estado, que interviria na vida dos cidadãos, sob o pretexto de promover a saúde. Em decorrência da primeira objeção, surge o conceito de Christopher Boorse (1977): saúde é ausência de doença. A classificação dos seres humanos como saudáveis ou doentes seria uma questão objetiva, relacionada ao grau de eficiência das funções biológicas, sem necessidade de juízos de valor.” (Scliar, 2007, p. 37).
A atenção que se quer chamar nesse momento do trabalho é para que a concepção do que seja doença e saúde, embora tenha apresentado um tensionamento entre correntes de visões distintas, acabou fazendo emergir uma forma de concepção e organização dos serviços de saúde e da assistência à saúde, bastante peculiar, centrado na atuação curativa do médico e no hospital como o seu local privilegiado. Nessa forma hegemônica – modelo médico curativo hospitalocêntrico - foi decisivo a influencia da medicina científica entre os profissionais de saúde, que tiveram sua formação
apoiada nos elementos centrais dessa medicina. Essa influencia também acabou criando um senso comum na população do que sejam doenças e de como devem ser tratadas, apoiadas nos avanços dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos. Certamente a forma como se entende saúde e doença acaba orientando a organização da atenção à saúde, em nosso caso, as ações empreendidas pelo SUS. A pertinência da discussão sobre o conceito de saúde e doença decorre do fato de que uma política pública como a PNPS será desenvolvida com a existência de pressões advindas dessa concepção e da forma de organização do próprio sistema de saúde. Essa explicitação inicial é então necessária, como base de analise da concepção de saúde da PNPS que será abordada no segundo capítulo. Porém, é necessário, ainda, desde já chamar a atenção para um dos desafios postos ao SUS no reconhecimento de um conceito ampliado de saúde e das premissas da promoção da saúde. Trata-se da forma como estão organizados os serviços de saúde a partir dos modelos assistenciais, pois na realidade esses modelos é que configura a forma como a assistência à saúde é prestada pelo Estado, no caso, no âmbito do SUS;
“O sistema de saúde brasileiro é hoje, palco de disputa entre modelos assistenciais diversos, com a tendência de reprodução conflitiva dos modelos hegemônicos, ou seja, o modelo técnico assistencial privatista (ênfase na assistência médico- hospitalar e nos serviços de apoio diagnóstico e terapêutico) e o modelo assistencial sanitarista (campanhas, programas especiais e ações de vigilância epidemiológica e sanitária), ao lado dos esforços de construção de ‘modelos alternativos”. Esse processo tem contemplado tentativas de articular ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação, em uma dupla dimensão, individual e coletiva, que passaram a ser operacionalizadas no processo de distritalização dos serviços de saúde... Desse modo, ao nível micro, vem se acumulando experiência na construção de “modelos alternativos” ao modelo hegemônico, incorporando, de certa forma, métodos, técnicas e instrumentos provindos da epidemiologia, do planejamento e das ciências sociais em saúde. Estas experiências apontam possibilidades concretas de construção de um “modelo de atenção à saúde voltado para a qualidade de vida...” (Teixeira et all, 2002.p.24).
Dentre esses modelos considerados alternativos, chamamos a atenção para a proposta da Vigilância em Saúde, que supera em muito, a perspectiva de integração entre as vigilâncias clássicas na saúde (epidemiológica e sanitária) e a mais recente (ambiental) com o planejamento, para ser uma proposta mais ampla, que considera novos sujeitos, objetos, meios de trabalho e formas de organização. Neste sentido, a Vigilância em Saúde propõe como sujeito deste modelo a equipe de saúde, juntamente com a população, assim como seu objeto; abrange os danos, riscos, necessidades e determinantes do modo de vida e saúde, tendo como meios de trabalho as