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Boletín de la Sociedad Entomológica Aragonesa (S.E.A.), nº 52 (30/6/2013): 323–343.
ETNOENTOMOLOGÍA BANIWA
Sunny Petiza
1
, Neusa Hamada
2
Ana Carla Bruno
3
& Eraldo M. Costa Neto
4
(^1) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Pós-Graduação em Entomologia, Caixa Postal 478, 69011-970, Manaus, Ama-
zonas, Brasil – sunnybio@gmail.com (^2) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Coordenação de Pesquisas em Entomologia (CPEN), Caixa Postal 478, 69011- 970, Manaus, Amazonas, Brasil – nhamada@inpa.gov.br (^3) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Núcleo de Pesquisas em Ciências Humanas e Sociais, Manaus, Amazonas, Brasil – abruno@inpa.gov.br (^4) Departamento de Biología, Universidade Estadual de Feira de Santana, Av. Transnordestina, s/n, 44031-460, Feira de
Santana, Bahia, Brasil – eraldont@hotmail.com
Resumen: Se recoge el conocimiento etnoentomológico de los indios baniwa residentes en la ciudad de São Gabriel da Cachoei- ra, en el noroeste del estado de Amazonas, Brasil. Se obtuvieron datos, mediante diversas técnicas etnográficas, a partir de 46 su- jetos de ambos sexos con edades que oscilaban entre 29 y 98 años. Los entrevistados tienen un conocimiento bien organizado de la biología, ecología y etología de los insectos, y ese acervo cultural tiene valor práctico en el funcionamiento de la sociedad bani- wa, puesto que los insectos se usan como alimento, medicina, diversión y como cebo para la pesca. Varios insectos son objeto de creencias populares y se consideran asociados a enfermedades. Muchos de estos conocimientos de los baniwa tienen relación con la entomología académica, pero hay creencias que sólo se ven explicadas en la ciencia de los baniwa a través de relatos mi- tológicos y en el contexto del conjunto de conocimientos de este pueblo. Palabras clave: Etnoentomología, sociedad indígena, cultura, Amazonia, Brasil.
Baniwa ethnoentomology Abstract: This study records the ethnoentomological knowledge of the Baniwa Indians living in the city of São Gabriel da Cachoeira, in the northwestern portion of the state of Amazonas, Brazil. Data were obtained by means of different ethnograpfic techniques performed with 46 adult participants of both sexes whose ages ranged from 29 to 98 years old. The participants have a well organised knowledge of insect biology, ecology and ethology. Such skills have a utilitarian value in guiding Baniwa society, since insects are used as food, medicine, entertainment, and as fishing bait. Several insects are the subject of folk beliefs and are associated with diseases. Much of this Baniwa knownledge is related to academic entomology, but there are other beliefs that only have explanations in Baniwa science through mythological stories and within the context of the Baniwas’ knowledge taken as a whole. Key words: Ethnoentomology, indigenous society, culture, Amazon basin, Brazil.
Introdução
Estudos etnoentomológicos demonstram que insetos e artró-
podes correlatos possuem diferentes significados e usos em
diversas sociedades (Cherry, 2006; Costa-Neto, 2003, 2004a;
Dufour, 1987; Posey, 1981, 1983; Rodrigues, 2005; Campbell
& Ibáñez-Bernal, 2006; Teixeira et al ., 2008; Alencar et al .,
2012). Na América tropical, esses animais estão presentes na
vida e na cultura material dos povos nativos. No Brasil, Posey
(1979) inaugurou os estudos de etnoentomologia pesquisando
o conhecimento entomológico dos Kayapó no Estado do Pará.
A Etnoentomologia é um ramo da etnociência que busca
compreender a maneira como diversas culturas percebem,
identificam, classificam, nomeiam, utilizam e conhecem o que
entendem por “inseto” em suas línguas. Para este estudo foi
adotado o termo Conhecimento entomológico Baniwa (CEB)
para se referir aos conhecimentos tradicionais dos povos
Baniwa e Coripaco relacionados aos Insecta. Apesar de haver
diferenças linguísticas entre estes dois povos, há uma autode-
nominação para ambos: Medzeniakonai (Lores, 2006). Para
este trabalho estamos adotando o termo Baniwa para designar
a todos os Medzeniakonai e também a ortografia do idioma
Baniwa-Kurripako de Ramirez (2001). Granadillo (2006)
mostra que há variações ortográficas para a mesma palavra
Coripaco ou Kurripako.
Cunha (2009) defende que os saberes tradicionais e
científicos são unidades em si mesmas comparáveis e com
algum grau de semelhança, como obras abertas e inacabadas,
se fazendo constantemente, procurando entender e agir sobre
o mundo. A autora afirma ainda que há tantos regimes de
conhecimento tradicional quanto existem povos e que para
cada conhecimento há seus processos de investigação, proto-
colos e modos de fazer: Enquanto existe por hipótese um
regime único para o conhecimento científico, há uma legião
de regimes de saberes tradicionais (Cunha, 2009: 302). Por-
tanto, considerando que cada sociedade humana possui uma
forma própria de perceber, conhecer, caracterizar, nomear e
classificar a diversidade biológica, pode-se imaginar que o
saber etnoentomológico da região amazônica configure-se tão
rico e diverso quanto o é sua diversidade entomológica, cultu-
ral e linguística.
O presente estudo objetiva registrar os conhecimentos
etnobiológicos e etnoecológicos acerca dos Insecta na con-
cepção dos povos Baniwa que vivem na cidade de São Gabri-
el da Cachoeira, a noroeste do Estado do Amazonas, Brasil.
Contribuuir para o ensino-aprendizagem nas escolas Baniwa e
Coripaco.
Os Baniwa
Os Baniwa se autodenominam Walimanai (humanidade que
povoa o mundo) ou Medzeníakonai , referindo-se aos povos
das etnias Baniwa e Coripaco. Estes povos vivem em tríplice
fronteira – Brasil, Venezuela e Colômbia, totalizando cerca de
12 mil pessoas. Falam o idioma Baniwa-Curripaco, perten-
cente à família linguística Aruak (Ramirez, 2001). Organi-
zam-se em clãs, grupos de parentes, onde cada clã possui uma
história de origem e os nomes se referem a animais ou estre-
las, como, por exemplo: Hohodene (filhos do inambu),
Dzawinai (filhos da onça), Adzáneeni (filhos do tatu-
canastra), Máoliene (filhos da caba) e Walipere-dakenai
(netos das plêiades).
São povos ribeirinhos sedentários que habitam a região
do Alto Rio Negro, uma região geográfica e cultural onde
coabitam outros povos indígenas que compartilham caracte-
rísticas comuns em seus modos de socializar recursos
naturais. Apesar de suas terras tradicionais estarem localiza-
das por toda bacia do Içana e de seus afluentes, atualmente
muitos estão vivendo em cidades, como Manaus, Barcelos,
Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira (Ri-
cardo, 2001).
Os Baniwa vivem essencialmente do cultivo da man-
dioca amarga ( Manihot sculenta Cranz), pelo sistema de
coivara e da pesca, complementada pela caça e coleta de
frutos e insetos (Garnelo & Buchillet, 2006). A arte da cesta-
ria Baniwa é parte de uma tradição de trançados bastante
antiga que conecta os Baniwa do noroeste amazônico aos seus
ambientes natural e espiritual (Wright, 2009). Apesar de sua
religião tradicional ser o xamanismo, atualmente os Baniwa
encontram-se divididos em comunidades católicas e evangéli-
cas, o que acaba gerando conflitos de interesses entre as lide-
ranças e famílias Baniwa em relação a projetos de desenvol-
vimento sustentáveis que são implantados mediante auxílio de
ONGs e associações locais indígenas (Wright, 1992, 2009).
Garnelo (2007) cita que a rica tradição mítica tem in-
fluência sobre a expressão das dimensões políticas, éticas e
práticas da vida social Baniwa, além de orientar os conheci-
mentos ancestrais que garantem a sobrevivência do grupo em
condições ambientais adversas. Os Baniwa estão buscando
uma forma de lutar pela sobrevivência por meios que contri-
buam para a construção de uma nova identidade e de uma
organização social modificada, para melhor se adaptarem às
novas condições históricas (Weigel, 2003).
Na cidade de São Gabriel da Cachoeira, os Baniwa vi-
vem basicamente da venda de produtos artesanais, da produ-
ção de farinha e derivados da mandioca (para os comerciantes
locais), pimentas jiquitaia (de várias cores e níveis de ardên-
cia) e da agricultura de corte-queima, onde conseguem legu-
mes e frutas da época (para venda na feira municipal).
Os Baniwa que moram na parte central da cidade vivem
nos bairros Dabarú, Areal, Boa Esperança, Graciliano Gon-
çalves, Padre Cícero e Miguel Quirino. Fora de suas terras de
origem, também vivenciam o atual contexto etnopolítico que
se encontra a cidade de São Gabriel, onde eles tentam retomar
de forma organizada o processo de ensino-aprendizagem dos
antigos conhecimentos sobre a natureza, além de desenvolver
meios de preservação das fontes pesqueiras ameaçadas e
renovar o interesse pelas relações cosmológicas que regem
sua existência (Garnelo, 2007).
É importante ressaltar que a partir da década de 1980,
com o fechamento dos internatos nos povoados do interior do
município, a cidade de São Gabriel tornou-se destino quase
que obrigatório para as famílias indígenas com crianças que
precisavam de escolas de ensino médio, uma vez que apenas
o ensino fundamental é assegurado nestes povoados. Portanto,
o fator escolar acaba se sobrepondo a outros e levando o
deslocamento de famílias da floresta para a cidade (Eloy,
2005; Emperaire & Eloy, 2008). Ainda, segundo estas auto-
ras, as famílias se instalam em novos loteamentos em casas
minúsculas na cidade ou constroem uma complementariedade
entre o sítio ou a comunidade de procedência e uma residên-
cia na cidade, de acordo com o calendário escolar.
Os Baniwa sempre deram muito valor à educação, haja
vista a eficácia do método de ensino-aprendizagem da língua
Baniwa via ensinamentos bíblicos da missionária norte-
americana Sophia Müller. Atualmente, encontra-se em pleno
funcionamento uma rede de escolas Baniwa-Coripaco (Escola
Indígena Baniwa e Coripaco - EIBC Pamáali ) na região do
Içana, onde o processo de ensino-aprendizagem se dá de
forma intercultural (Baniwa e português) e via pesquisa, co-
nhecimentos tradicionais associados às novas tecnologias e
aos saberes não-indígenas, como técnicas de piscicultura,
meliponicultura e manejo agroflorestal.
Porém, apesar de possuírem uma proposta pedagógica
bastante inovadora, atualmente suas escolas sofrem com a
falta de material didático específico para os alunos. E é a
partir daí que surge a necessidade e a importância deste estu-
do em uma das áreas da Etnobiologia (Etnoentomologia), para
que além do ato de fazer ciência, também se possa criar meios
para o desenvolvimento da qualidade do ensino nas escolas
indígenas.
Portanto, nosso objetivo geral neste trabalho foi investi-
gar o conhecimento entomológico Baniwa (CEB) no contexto
urbano da cidade de São Gabriel da Cachoeira, registrando-se
o significado da palavra “inseto” na concepção Baniwa, a
existência de uma etnotaxonomia Baniwa sobre os artrópodes
da classe Insecta, bem como identificar as formas de ensino-
aprendizagem do CEB.
Metodologia
Descrição da área de estudo
O local da pesquisa foi a área urbano-rural da cidade de São
Gabriel da Cachoeira, localizada no município de São Gabriel
da Cachoeira, extremo noroeste do Estado do Amazonas. Este
município é habitado por mais de 20 povos indígenas que
somam mais de 90% dos 37,5 mil habitantes (IBDS, DSEI/
FOIRN 2005 in Lei Municipal no. 209, 2006).
Os dados foram coletados em três comunidades rurais
localizadas na cidade de São Gabriel da Cachoeira na estrada
de Camanaus: Vila Amazonino (km 9, 0º8’55,5”S/ 67º0’
52,6”O), Itacoatiara-Mirim (km 10, 0
º
9’13,7”S/ 67
º
0’16,1”O)
e Areal (Km 19, 0º9’2”S/ 66º57’7”O). Estas comunidades
possuem em média 15-20 anos de fundação, começaram por
famílias recém-chegadas de sítios (são unidades de residên-
cias isoladas, compostas por uma ou duas casas ocupadas
pelos membros de uma mesma família) e comunidades locali-
zadas ao longo da bacia do rio Içana que foram se instalando
e formando novas famílias (Emperaire & Eloy, 2008).
Coleta de dados
Ao todo, participaram do estudo 46 indivíduos das etnias
Baniwa e Coripaco com idades entre 29 a 99 anos. Deste
total, quase 50% é composto por mulheres, o que é relati-
A escolha das comunidades se deu pelas indicações do
vice-prefeito da cidade e do presidente da Organização Indí-
gena da Bacia do Içana - OIBI, ambos fontes-chave partici-
pantes deste estudo. Segundo eles, as comunidades Areal,
Itacoatiara-Mirim e Vila Amazonino são as que possuem o
maior número de pessoas das etnias Baniwa e Coripaco con-
centradas na cidade. Nessas comunidades, os dados não foram
simplesmente coletados, mas foram construídos em coautoria
pela pesquisadora e pelos participantes.
Análise dos dados
Para as análises desta pesquisa foram utilizados alguns pres-
supostos teóricos da Antropologia, da Linguística e da Etno-
biologia para compreender a Etnoentomologia Baniwa: aspec-
tos cognitivos, classificatórios, etnotaxonômicos e perspecti-
vistas, bem como as abordagens eticista e emicista da pesqui-
sa etnocientífica (Sturtevant, 1964; Harris, 1976; Levi-
Strauss, 1989; Berlin, 1992; Cunningham, 1996).
A contribuição do conceito perspectivista atribuído por
Eduardo Viveiros de Castro (1996, 2002), em que tanto hu-
manos quanto animais são vistos como seres dotados de in-
tencionalidade e volição, contribuiu significativamente para a
compreensão das categorias analíticas com as quais exami-
namos os dados registrados sobre a etnotaxonomia dos insetos
reconhecidos pelos Baniwa.
Procuramos não utilizar categorias pré-concebidas por
outros estudos em etnobiologia/etnoentomologia, pois estes
poderiam limitar o processo de coleta e construção dos dados
em campo. Portanto, as categorias aqui criadas para os formu-
lários e análise de dados foram retiradas de estudos iniciais
sobre a cultura, língua e cosmogonia Baniwa, pela leitura
prévia das narrativas mitológicas (Cornelio, 1999) e estudos
antropológicos (Wright, 1996; Garnelo & Buchillet, 2006;
Garnelo, 2007). O tratamento dos dados foi realizado sob as
formas quantitativa e qualitativa, com dados amostrados por
meio de gráficos simples construídos em Excel 2010.
Resultados
No léxico Português-Baniwa, encontrado ao final do dicionário
de Ramirez (2001), a palavra inseto é traduzida por tsiiríto , que
significa “um tipo de inseto encontrado nos ingazeiros”. Neste
dicionário, a maioria das palavras referentes a inseto ou a ou-
tros animais pode ser acompanhada de prefixos pessoais, como
(- no ) para indicar o possessivo na primeira pessoa do singular,
e de sufixos dependentizadores, como ( -ni, -le ou -te ). Assim,
podem ser encontradas as seguintes palavras: notsiirítole ou
notsiirítoni , indicando “o meu inseto”.
Foram registrados 280 nomes diferentes de insetos per-
tencentes a 18 ordens da classe Insecta e classificados em 17
categorias Baniwa de classificação geral para os seres vivos.
O maior número de insetos registrado pertence à ordem Hy-
menoptera. Na cultura Baniwa não há uma palavra para agru-
par todos os tipos de insetos (Insecta), todos os tipos de abe-
lhas, vespas e formigas (Hymenoptera) ou todos os tipos de
besouros (Coleoptera) na língua Baniwa. No entanto, cada
grupo possui uma denominação e, geralmente, está agrupado
dentro de alguma das seguintes etnocategorias: Hitsiakapé
(rastejam), Iarakapé (voam), Yokukapé (ferram), Inhuãkapé
(mordem), Irakapé (picam e chupam sangue), Yoópinai (cau-
sam doenças), Maokukapé (não ferram), Paihanipé (comestí-
veis), Makadawanai (não servem para comer), Paitselitaxw-
pakophé (iscas de pesca), Kinikipíra (pragas de roça), Pantti-
píra (pragas de casa).
Existem insetos considerados Awakaróna (espírito da
floresta/curupira) da classe dos Awakarónanai (curupiras em
geral). Segundo Garnelo et al. (2005), “Estes surgem nos
relatos em forma de pessoas que alternam relações de aliança
e de hostilidade com Niãpirikoli e outros proto-humanos,
gerando alguma forma de benefício ou prejuízo, que influen-
ciará na vida futura dos Walimanai , quer dizer, nós, os atuais
viventes”.
Os insetos também podem ser classificados de acordo
com as classes de Yoópinai , juntamente com outros animais
(cobras, lagartos, sapos, etc.), a saber:
1. Awakadalikaperi (que anda no mato) - aapi (cobra),
dzaré (escorpião), mánee (tocandira), ame (formiga-de-fogo),
atápa e ámali (formigas), apihiwidakoro (Corydalidae: Mega-
loptera); Kawalerikaperi (que anda no vento) - makálo (bor-
boleta), héeri (mutuca), ainíidzo (mosquito).
2. Õonirikoperi (que anda na água) - ñewi (aranha-
d’água, Heteroptera).
Foram encontradas sete correspondências de nomes Ba-
niwa para as seguintes ordens de insetos: Kethepialinai (E-
phemeroptera), Ñepolinai (Odonata e Neuroptera), Keétonai
(Isoptera), Polétanai (Blattodea), Philiphilinai (Mantodea),
Ttowídanai (Phthiraptera) e Makálonai (Lepidoptera).
Para as outras ordens mais abrangentes foram encontra-
dos mais de um nome, alguns correspondentes aos nomes de
famílias: Orthoptera ( Tsíalinai , Tsakáranai – Acrididae; Dsíi-
ronai – Tettigonidae; Dápharonai – Gryllotalpidae), Auche-
norrhyncha ( Tsiríitonai – Membracidae; Tsíidanai – Cicadi-
dae e Cicadellidae), Coleoptera ( Déetonai – Curculionidae;
Tsietsiépaaro – Passalidae; Iixídaa e Katsowádanai –
Scarabaeidae), Hymenoptera ( Mápanai – Apidae; Áininai –
Vespidae) e Diptera ( Dóolonai – Muscidae; Héerinai – Taba-
nidae; Máapiirinai – Simuliidae).
Diversos insetos são classificados como Yoópinai , ou
seja, como espíritos maléficos da mata, da água e do ar, donos
dos rios, dos animais e das florestas, responsáveis por dores
repentinas e ataques aos humanos, causando-lhes diversos
tipos de doenças (Ramirez, 2001; Garnelo, 2003). Investigan-
do alguns relatos míticos, verificamos que os Yoópinai , “que
perderam sua condição humana por terem transgredido as
regras de aprendizado xamânico, acabaram enlouquecendo
[...] e foram transformados em insetos, peixes, répteis e outros
seres da natureza” (Garnelo & Buchillet, 2006). Importante
também salientar que: Nas ontologias ameríndias, a intencio-
nalidade e a consciência reflexiva não são atributos exclusi-
vos da humanidade, mas, potencialmente, de todos os seres
do cosmos. Em outras palavras, animais, vegetais, deuses e
monstros podem também ser “pessoas” e ocupar a posição
de sujeito na relação com os seres humanos (Fausto, 2002).
Nos saberes ameríndios, a subjetividade não está restrita
aos humanos, mas a todo e qualquer tipo de ser (para isso,
basta existir). Até mesmo uma pedra, para os Baniwa, por
exemplo, é dotada de sentimentos e possui um nome próprio.
No caso dos seres Yoópinai , mesmo estes perdendo sua forma
humana e adquirindo configuração animal, não perderam sua
essência humana, ou seja, não deixaram de ter intencionalida-
des e consciência reflexiva, a qual, pela filosofia ocidental, é
atribuída somente aos humanos. Porém, na filosofia ameríndia
se conhece mais pelo viés da subjetivação, enquanto para a
ciência ocidental quanto mais se dessubjetivar e objetivar os
seres em questão, melhor se conhece sua estrutura e funcio-
namento (Viveiros de Castro, 2006).
As estruturas morfológicas dos insetos também recebem
nomes específicos na língua Baniwa, como no exemplo abai-
xo que retrata os nomes atribuídos às partes da formiga tocan-
dira Paraponera clavata (Figura 2, Quadro 1). Muitos dos
nomes correspondem a partes do corpo humano, como verifi-
cado em Ballester (2006) com os Kaiabi no Xingu. Porém,
alguns nomes são utilizados especificamente para a morfolo-
gia do inseto (ver Quadro 1: 2-4).
Os Baniwa reconhecem aspectos ecológicos, morfológi-
cos, etológicos, diferentes fases de desenvolvimento biológi-
co, reprodução, padrões de sazonalidade, habitat e relações de
parentesco entre os insetos. Os insetos reconhecidos pelos
Baniwa são apresentados a seguir pelos nomes das ordens às
quais pertencem. Algumas ordens foram reunidas, pois foram
coletados poucos nomes associados às mesmas.
● ZYGENTOMA, PHASMIDA, DERMAPTERA, PLECOPTERA,
MANTODEA, PHTHIRAPTERA, MEGALOPTERA,
SIPHONAPTERA E EPHEMEROPTERA
O conhecimento Baniwa sobre estes grupos de Insecta pode
ser visto no Quadro 2, que reúne informações acerca dos
seguintes aspetos: hábito de forrageio, habitat e interação
ecológica entre a traça (Zygentoma) e as penas de arara
(Aves, Psittacidae); padrão de sazonalidade dos Ephemerop-
tera e seu nicho ecológico; microhabitat e distribuição de
Dermaptera em igapós do alto rio Negro; habitat de Phas-
mida; microhabitat, padrão de sazonalidade e hábito de
forrageio de Mantodea; fase de desenvolvimento e tipos de
piolhos (Phthiraptera) que ocorrem em cachorro, tucano e
galinha; microhabitats específicos de adultos de Megalopte-
ra (Corydalidae); tipos de Siphonaptera, como o bicho-de-
pé e pulgas de cachorro e de paca; locais de ocorrência das
ninfas de Plecoptera.
Piolhos, pulgas e bichos-pau são concebidos linguisti-
camente como formas achatadas e pertencentes ao gênero
masculino através do classificador numérico -iíta (ex.: apaíta
ttowída - um piolho). Porém, um tipo de pulga ( kawánhero ) é
classificado como arredondado, sendo seu classificador numé-
rico diferente ( -da ). Louva-deus é aprendido como uma forma
alongada ( -aápa ).
Insetos que se parecem com gravetos (Phasmida, Man-
todea – Thespidae, Heteroptera – Nepidae e Orthoptera –
Proscopiidae) são conhecidos entre os Baniwa por: hémaa
(anta), yoopinai (doença), hémaa yoópinai (doença de anta),
hémaaimókawani (espingarda de anta) e iñaimitterolépi (tipiti
do diabo). A aparência de graveto, caráter morfológico que
reúne estes grupos de insetos, acaba por estabelecer uma
relação de parentesco entre eles, reconhecida pelos Baniwa
como “parentes” ou “primos”. Estas associações provavel-
mente devem ter explicações mitológicas. Yoópinai são espíri-
tos maléficos que vivem na terra e na mata, são responsáveis
por dores repentinas chamadas de maiwa ; já o tipiti é um
cesto cilíndrico no qual se põe a mandioca que se vai espre-
mer para retirar o veneno, a manicuera (Ramirez, 2001).
De acordo com o conhecimento entomológico Baniwa,
sobre estes Insecta temos as seguintes hipóteses a serem con-
firmadas pela ciência: os louva-deus cantam ou possuem
alguma forma de estridulação? Que espécies de pulgas podem
ocorrer em pacas (mamíferos da família Cuniculidae) e de que
forma ocorre esse ectoparasitismo?
Fig. 2. Estruturas morfológicas de uma formiga tocandira ( má-
ane yarakaá ). Desenho: P1.
Quadro 1. Nomes relacionados à morfologia externa de uma tocandi- ra ( máane yarakaá ) reconhecidos pelos participantes.
No^ Baniwa Português Fonte Antena 0 1 litsima pattolema/ litsinoma lidzekema antena
P
0 (^2) litsinoma hiwidana flagelo 0 3 litsinoma pamodzoa pedicelo 0 4 litsinoma itañida escapo Pernas 0 5 likaapi pattolema perna anterior
P
0 6 likaapi lidzekema perna posterior 0 7 likotshi lidzekema coxa 0 8 lhiorhi lidzekema fêmur 0 9 likawaphi lidzekema tíbia 10 lipha lidzekema tarso Outras estruturas (^11) Liwaphi corpo do inseto H1 e P 12 liphe lidzekema asa
● ODONATA E NEUROPTERA
A semelhança morfológica entre Odonata e Neuroptera fez
com que os participantes da pesquisa reunissem estes dois
taxa em um único grupo chamado Ñepoli.
Para a entomologia acadêmica, Odonata e Neuroptera
não têm nada em comum, a começar pelo tamanho das ante-
nas, sendo que Neuroptera possui antenas longas e pertence à
infraclasse Neoptera; já Odonata pertence ao grupo Paleoptera
e possui antenas bem menores. O grupo-irmão de Neuroptera
é Megaloptera, por meio de sinapomorfias de base principal-
mente morfológica (Aspöck et al. , 2001).
As libélulas são apreendidas linguisticamente pelos Ba-
niwa como formas achatadas e pertencentes ao gênero mascu-
lino através do classificador numérico -iíta (ex.: apaíta ñepoli
- uma libélula). O conhecimento dos Baniwa sobre Odonata e
Neuroptera pode ser conferido no Quadro 3.
São conhecidos como Ñepolinai (libélulas em geral),
onde os adultos foram classificados em três categorias: Iara-
kapé (voam), Maokukapé (não ferram) e Yoopinai (podem
trazer doença). A explicação para esta última classificação é a
de que estes insetos, apesar de não ferrarem, podem, em de-
terminadas circunstâncias, “flechar doenças” aos humanos,
quando estes fazem uma incursão pelo mato. O mesmo ocorre
com as ninfas aquáticas, classificadas como Õonirikoperi
( Yoopinai que anda na água), porque se forem pisadas em
ambiente aquático também podem flechar doenças aos seres
humanos, principalmente para as mulheres.
Quadro 3. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Odonata (libélulas) e Neuroptera.
Nº Nome Baniwa Nome Português
Nome científico Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
01 ñépoli^1
Libélula
Odonata/ Neuroptera (Ascalaphidae)
Anda no rio e fica voando sobre a água. Lipakakawa - posição em tandem. Põe ovos em galhos sobre a água. Ñepolieni – seus filhotes. Aparece depois da chuva, quando o tempo abre e fica ensolarado.
Iarakapé (voam)/ Maokukapé (não ferram)/ Yoopinai (podem trazer doença)
02 *ñepolitsiki Odonata: Zygoptera Um tipo de ñépoli menor, mais fino.
03
*nhãpirikulidana/ ñepolikulidana
Odonata: Anisoptera Um tipo de ñépoli maior.
04 pootetéelo^1 Odonata
Variante meridional (Ramirez, 2001). Falado na região de Victorino (rio Guaiania, Venezuela) entre os clãs Baniwa: Dzawi-Minanai, Adaro-Minanai, etc. 05 *nhãpirikuli iêman Zygoptera Um tipo de nhãpirikuli.
06 *nhãpirikuli
Zygoptera: Pseudostigmatidae ( Microstigma rotundatum Selys, 1860 e Microstigma macula- tum Hagen in Selys, 1860) e Polythoridae (Chalcopteryx rutilans Rambur, 1842)
Um tipo de nhãpirikuli pintado. São magrinhos e possuem mancha amarela na ponta das asas. Se ele chegar perto de uma pessoa que tá fazendo canoa, significa que a canoa vai ficar bem bonita. 07 *ñépoli iráite Anisoptera: Libellulidae/ Gomphidae Libélula vermelha. 08 *ñépoli hipoléte Anisoptera: Aeshnidae Libélula verde. 09 *ñépoli keramáite Anisoptera Libélula marrom. 10 *ñépoli itáite Aeshnidae Libélula preta. NINFAS
*dzíiro- óonirikóoperi
Grilo- d’água
Gomphidae (ninfa)
Pode ser encontrado no igarapé, na praia, na beira do rio, em amontoados de folha no fundo. Transforma-se em ñépoli. (^) Õonirikoperi ( Yoopinai que anda na água)
12 *yakelopa
Anisoptera (ninfas) Vive na água, depois se transforma em ñépoli. 13 *kophéyorodáli Gomphidae O nome significa “doença de peixe”. 14 *yakahiroitã Libellulidae Um tipo de ñépoli quando vive na água.
15 *dzáakaikoiro Tia-do- camarão
Zygoptera (ninfas) Um tipo de ñépoli quando vive na água.
*Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001). - Informação ausente.
Quadro 4. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Orthoptera (grilos, gafanhotos e esperanças).
Nº Nome Baniwa
Nome portu- guês Nome científico^ Dados etnoentomológicos^ Classificação Baniwa
01 dáaphaaro^1
Paquinha/ Grilo toupeira
Gryllotalpidae Encontrado na beira do igarapé ou na areia da praia. -
dzíiro^1 (Baniwa) / dziir- ru^2 (Baniwa do Ayari) / wiríño (Coripaco)
Grilo Acrididae
Um tipo de grilo. Alimenta-se de folhas da mandioca. Um gafanhoto que canta “ wiriño ”.
Kinikipíra (pragas de roça)
03 *dzíiro itáite Grilo preto - Um tipo de grilo. -
04 píito^1 Grilo Gryllidae
Um tipo de grilo preto que serve de isca pra pescar. Vive nos tocos de pau, em buracos de casca de pau caído na roça. Servem de comida para pássaros e aves de criação. Canta à noite e seus filhotes são iguais aos pais. Pode voar, correr e pular.
Paitselitaxwpakophé (isca para pescar)
05 tsákara^1 Gafanhoto
Tettigoniidae: Pterochrozini, Phaneropterinae e Listrosce- lidinae/ Romaleidae/ Eumas- tacidae
Um tipo de gafanhoto verde e grande que vive só nas folhas da roça ou do açaizeiro. Tsákaraieni – seus filhotes. Come folha de mandioca.
Maokukapé (não ferram)/ Yoopinai (podem trazer doença)/ Kinikipíra (pragas de roça)
*tsákapheerikoite/ tsákaikoikoiro Tios dos gafanhotos
07 manéeñai^1
Gafanhoto
Um tipo de gafanhoto preto. Ficam de muitos na roça, podem ficar no tronco da mandioca. Iarakapé (voam)/ Yokukapé (ferram)/ Kinikipíra (pragas de 08 *manéeñai ewápali - roça)
Um tipo de gafanhoto que possui pontinhos amarelos. Encontrado em grupos nas roças do Içana, come folhas de cubiu e de mandioca. 09 *manéeñai itápali - - Um tipo de gafanhoto que possui manchas vermelhas. -
10 *tsíali -
Tettigoniidae ( Panoploscelis specularis Beier, 1950 )
Pode ser encontrado nas roças, sobre galhos de árvores, sobre folhas de palmeiras (arumã), próximo a igarapés ou na beira de rios. Come folhas e nasce na terra.
Yoopinai (podem trazer doença)/ Paitselitaxwpakophé (isca p/ pescar)
11 *patéte - Tettigoniidae
Encontrado na folha seca da bananeira ou sobre folhas de inajá, açaízeiro, coqueiro e tucumãzeiro.
12 *makaithíipe - - Fica na roça e se alimenta de folhas da mandioca. Kinikipíra (pragas de roça) 13 *takáapa Grilo Tetrigidae/ Acrididae Um tipo de grilo. -
14 *hémaa/ yoopinai/ iñaimitterolépi
Majuba de anta/ Tipiti do diabo
Proscopiidae Encontrado sobre folhas e galhos no mato. Yoopinai^ (podem trazer doença)
15 *panáphe
Tettigoniidae ( Typophyllum, Cycloptera e Pycnopalpa )
Se disfarçam de folhas.
16 *hipoliápali - Um tipo de grilo. *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001); 2 Explicação encontrada em Taylor et al. (1993); - Informação ausente.
Quadro 5. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Isoptera (cupins).
Nº Nome Baniwa Nome português
Nome científico
Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
01 kamára^1 Cupim Termitidae
Mora dentro de casa e come madeira. Constrói casa grande. Kamaráda - casa de cupim; kamaraphé - rainha, cupim que voa. Panttipíra (pragas de casa) 02 máaro^1 Um tipo de cupim que vive na terra, muito destruidor.
03 dáane^1
Maniuara
Um tipo de maniuara que vive em áreas de terra firme e no baixio próximo à nascente de igarapés. Aparece mais no inverno. Constrói casa de barro sobre a terra. Daanephé - rainha, que voa.
Iarakapé (voam)/ Inhuãkapé (mordem)/ Paihanipé (comestíveis)/ Paitselitaxwpa- kophé (isca para pescar)
04 keétto^1 -
Um tipo de maniuara comestível de tamanho médio. Faz ninho subterrâneo. Limpam bem o terreno ao redor do ninho, catam folhas para comer. São encon- trados somente durante as fases de lua nova ou cheia. Keéttophé - rainha que voa e keéttokóoro - não voa. 05 *walitsikeéttoni - Um tipo de keétto.
(^06) maáki^1 - Um tipo de maniuara comestível, que tem um pêlo na cabeça, dente afiado e cheiro forte. É encontrado somente durante as fases de lua nova ou cheia.
07 *kanaliére -
Possui cabeça grande, cheiro mais forte que keétto e de tamanho maior, como dáane. Faz ninho subterrâneo embaixo de uma palmeira pequena ( doohépa ) encontrada na 1ª. capoeira formada após a derrubada de uma floresta primária.
08 *wẽrni -
Possui cabeça pequena e um bundão, cheiro mais fraco. Faz ninho subterrâ- neo, mesmo habitat descrito acima para kanaliére. Wẽrniphé - rainha, mãe. *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001);
Os únicos representantes reconhecidos como cupins fo-
ram kamára e máaro , associados à Termitidae, porque não
são comestíveis e por fazer ninho em árvores e casas de ma-
deira. O restante é considerado “maniuara” (parente de saú-
va), pelo fato de também ser comestível (lanche do mato),
construir ninho subterrâneo e por explicações mitológicas, ou
seja, surgiram no mundo em um mesmo momento e de uma
mesma forma.
A utilização de ninhos arborícolas de cupim para ali-
mentação de peixes em lago de criação foi uma prática obser-
vada na comunidade Itacoatiara-Mirim. O Sr. M1 retirava
uma parte do ninho da árvore, colocava sobre uma bacia e, em
seguida, transportava-a até o lago, onde havia uma estrutura
suspensa na qual ele deixava o ninho para que os cupins caís-
sem e pudessem servir de alimento para os peixes que ele
criava, mas alguns cupins eram jogados diretamente no lago.
Keétto é um tipo de maniuara comestível de tamanho
médio (Ramirez, 2001). É possível que várias espécies de
cupins que constroem ninhos subterrâneos sejam apreciadas
pelos Baniwa como recurso alimentar (Figura 3). Segundo
Dufour (1987), os cortadores de folha do gênero Syntermes
foram os mais importantes na dieta dos povos Tukano, tam-
bém localizados no noroeste amazônico. Os soldados de Syn-
termes eram coletados da mesma maneira que os soldados de
formigas do gênero Atta , segundo Dufour (1987), que tam-
bém registrou o uso destes insetos como isca de pesca.
Há algumas crenças em torno de maniuaras, como é o
caso dos cupins comestíveis ( Keetonai ):
“Quando a mulher está menstruada, de resguardo ou
depois de ter neném, não pode comer keétto , pois possuem
dentes afiados. A menstruação aumenta e não passa rápido,
pode fazer mal para o cabelo de mulheres em resguardo, pois
os dentes da maniuara podem cortar o cabelo delas” (Dona
L4).
A explicação para este tipo de restrição alimentar é que
durante as fases de resguardo e da menarca o corpo da mulher
fica desprotegido, tornando-a visível para o mundo dos Yoó-
pinai (seres maléficos). Dessa forma, a mulher poderia facil-
mente ser capturada por uma alteridade (outro ser social, com
o qual se está relacionando, no caso uma maniuara) selvagem
(Garnelo, 2003). Neste caso, a maniuara pode ser capaz de
provocar uma doença da feminilidade ( Hiwiathi - excesso de
menstruação, hemorragias pós-parto, morte pré e pós-natal do
feto, etc.), caso a mulher não tenha recebido os devidos ben-
zimentos, não tenha cumprido os rituais de passagem ou de-
sobedecido as regras de restrição alimentar.
A presença e o odor do sangue evidenciam que há uma
metamorfose em curso, momento delicado em que a pessoa
fica passível de ser apropriada por outros sujeitos do cosmos
(Fausto, 2002). Portanto, o universo relacional das pessoas em
resguardo deve ser limitado, ou seja, controlado por uma série
de restrições alimentares para evitar que os processos de
transformação tomem a direção errada (Fausto, 2002).
Segundo Garnelo & Buchillet (2006), a hostilidade dos
Yoópinai é manifestada, sobretudo, nos períodos em que a
mulher mostra seus sinais de fertilidade e capacidade procria-
tiva, significando para os Yoópinai um aumento futuro da
predação humana sobre o mundo animal.
Sobre este argumento, é importante mencionar o concei-
to de “predação familiarizante” formulado por Fausto (2002),
onde ele analisa, sob o viés do perspectivismo, que a predação
está intimamente associada ao desejo cósmico de produzir
parentesco e, quando esta se dá por meio da doença, os hu-
manos correm o risco de se tornarem um animal (predação
familiarizante dos animais). Assim, “o que é doença para os
humanos pode ser guerra para os animais” (Fausto, 2002).
Por meio do estudo das práticas de resguardo, dieta e
reclusão, Belaunde (2006) mostra que a manipulação do san-
gue ocupa um lugar central na saúde amazônica, indicando a
capacidade transformacional do sangue:
“Sangrar é uma prerrogativa feminina [...], põe a fertili-
dade em movimento, abrindo a comunicação entre o tempo
cotidiano e outros espaços-tempos cosmológicos, expondo
ambos os gêneros ao perigo da multiplicidade transformacio-
nal, à alienação e à morte.” (Belaunde, 2006).
Durante a menarca, a menina encontra-se numa fase de
transição para o corpo de mulher, significando biologicamente
que a partir deste momento ela terá a capacidade de gerar
outro ser a partir de seu próprio sangue. Isto faz sentido tanto
do ponto de vista ético (analítico), quanto do êmico (cogniti-
vo).
Quadro 7. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Auchenorrhyncha e Sternorrhyncha (pulgões e cigarrinhas).
No. Nome Baniwa Nome português
Nome científico Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
tsíida^1 (Baniwa)/ *tsíyai ou *tsíyai-tsíyai (Coripa- co)
Cigarra
Cicadidae, Cicadelli- dae, Cixiidae
É relógio de Baniwa. São identificados pelo tipo de canto. Pode ser encontrado em qualquer lugar, canta antes do verão chegar, antes do dia amanhecer, no entardecer e antes de anoitecer. Também pode indicar quando uma pessoa alegre vai chegar ou quando não vai chover. É advinho e seu canto dá a direção do casamento, diz se a pessoa vai casar pro norte, sul, leste ou oeste. (^) Iarakapé (voam)/ Maokukapé (não ferram) 02
dzóroo^1 (Baniwa) / *daridari ou yoroóda (Coripaco)
Primo do tsíida e parente de lhíw. Durante uma parte de sua vida vive debaixo da terra. Constrói uma casa em forma de torre no chão, chamada dzóroo ípana. Canta quando amanhece dia ensolarado e no mês de julho.
03 *lhíw
Fulgoridae: Aracyn- thus sanguineus Olivier, 1791
Era a amante preguiçosa de Nhãnpirikuli que não gostava de ir para a roça. Dá sinal de dia ensolarado.
04 tsiiríto^1 / tsiríto^1 - Membracidae
Um tipo de inseto pequeno, verde e comestível, que vive em fileiras nos galhos do ingazeiro. Ocorre mais no começo do ano, durante o tempo de chuva. Paihanipé (comestí- 05 veis)
*máami (Baniwa)/ *hawayamále (Coripaco)
Vive nos galhos e troncos das ingazeiras. Ocorre mais no começo do ano, no inverno. É gostoso frito com beiju. O nome máami se refere a uma ave da família dos tinamídeos, inambu-galinha (Ramirez, 2001).
06
*máami irukapéhawad- zanako
Fica em fileiras nos galhos da árvore de ingá e também é comestível. Também pode ser praga de maniva.
07 *yakilana Jequitiranabóia Fulgoridae: Fulgora
Parece um makálo , mas tem espora. Se ferrar, a dor só passa se a pessoa fizer sexo. Yoopinai (podem trazer (^08) *óolukai doença)
Auchenorrhyncha
09 *yawakaluna -
10 *áalito
Sternorrhyncha: Coccidae Ocorre no mês de agosto, fica em galhos de árvore na beira do rio.^
Paitselitaxwpakophé (isca para pescar) *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001). - Informação ausente.
Quadro 8. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Coleoptera (besouros).
No. Nome Baniwa Nome português
Nome científico Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
01 déeto^1
Besouro
Curculionidae: Rhyncophorus sp.
A larva e o adulto (retirado as asas) são comestíveis. Vivem dentro de troncos caídos de patauá, de bacaba ou na pupunha. É mãe da moxiwa. Paihanipé^ (comestíveis) 02 *dzépalo Curculionidae Um tipo de déeto.
03 katsowádani^1
Scarabaeidae (Dynastinae) Besouro grande e avermelhado.^ - 04 taapalíko^1 Vive na casca de pau seco e podre na roça. Tapé (servem como remédio) 05
tsietsiépaaro^1 / *tsiẽpáro Passalidae^
Vive dentro de pau podre e pode ser itáite (preto) ou keramáite (mar- rom). 06 *itsíideni Joaninha Coccinellidae Jabuti pequeno de inseto. -
07 iixídaa^1 Rola-bosta Scarabaeidae
Besouros pretos ou verdes. Podem ser encontrados no abacaxi. Vivem enrolando merda de anta na campinarana.
Makadawanai (não serve para comer)
08 tákairo^1 Serra-pau Cerambycidae
Corta galho de árvore no começo do verão, fica fazendo a roça dele. Quando aparece é sinal que o verão tá começando. - 09 *tákairo dzoíte Um tipo de tákairo pequeno. -
10 tóoke^1
Vaga-lume
Elateridae/ Lampyri- dae
Seus olhos brilham.
Iarakapé (voam)/ Yoopinai (podem trazer doença)
11 aawítti^1 Aparece na boca da noite, possui luz própria e é parente de tóoke.
Maokukapé (não ferram)/ Makadawanai (não serve para comer)
12 *ñeritóokeni Elateridae ( Chalcole- pidius )
Vive em pau podre na roça, voa e vive só. Iarakapé (voam)
13 *néeri - Elmidae Um tipo de besouro.
14 * bwíe - - Fica na casca de pau quando a gente queima a roça. (^15) * taitáilo - - Um tipo de besouro. 16 * dzemõamõaani - - Um tipo de besouro. 17 *matsítali - - Encontrado na roça. 18 *wapakái - - Vive na terra firme.
19 háliere^1
Moxíua (larva)
Curculionidae
Larva de besouro. Ocorre mais na época de chuvas. Fica dentro do tronco do patauazeiro morto. Põe ovos no pé de bacaba seco/ morto. Faz barulho e buracos no tronco.
Paihanipé (comestíveis) 20 moódi^1 Curculionidae:
Rhyncophorus sp.
Larva de déeto , um tipo de moxiua marrom/ branco e grande, que pode ser criada em tronco de bacaba/ patauazeiro derrubado durante 2 meses.
21 tsiódere^1 Moxíua grande. Também se transforma em^ déeto^ e vive dentro de certos troncos derrubados: patauá, bacaba, buriti. 22 *dzexéni Larva
23 *dzémoli Passalidae Vive na terra, em pau podre. Transforma-se em tsietsiépaaro. *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001). - Informação ausente.
Já os yakilana (jequitiranabóia, Fulgora sp.) carregam uma
crença curiosa compartilhada por etnias de alguns países
latino-americanos: Se ferrar, a dor só passa se a pessoa fazer
sexo (J4). Costa Neto (2004b) relata a existência desse saber
popular na Costa Rica e na Colômbia; para o Brasil havia sido
relatada apenas a afirmativa de que este inseto carregaria um
veneno mortal.
● COLEOPTERA
Os Coleoptera são apreendidos linguisticamente sob duas
formas: arredondada, por meio do classificador numérico - da
(ex.: háliere , iixídaa , katsowádani , moódi , tákairo , tsiódere );
e achatado e masculino - iíta ( aawítti , déeto , moódi , taapalíko ,
tóoke , tsietsiépaaro ). O conhecimento dos Baniwa sobre os
besouros pode ser visto resumidamemte no Quadro 8.
As larvas de Curculionidae são comestíveis e bastante
apreciadas entre os Baniwa, pois eles sabem exatamente onde
e quando as larvas ocorrem, inclusive realizam sua criação em
locais com troncos caídos de palmeiras, principalmente da
bacabeira ( Oenocarpus bacaba Mart.).
● HYMENOPTERA
Há dois clãs Baniwa que levam nomes de insetos Hymenopte-
ra: Máoliene (filhos da caba) e Kottéeroeni (filhos da abelha
brava). Curiosamente, também há dois grupos de clãs Kurri-
pako com nomes de Hymenoptera: Aini-dakenai , Maulieni e
Káwa-tapúya (netos da vespa) e Mapa-dakenai , Mápanai e
Mapátse-dakenai (netos da abelha), segundo Granadillo
No presente trabalho, apresentamos 108 nomes Baniwa
de insetos pertencentes à ordem Hymenoptera coletados na
literatura existente sobre estes povos (Taylor et al. , 1993;
Ramirez, 2001; Fernandes et al ., 2009) e por meio de entre-
vistas com os participantes da pesquisa, identificados por
siglas entre parênteses no Quadro 9.
Podemos perceber que os Baniwa possuem saberes de-
talhados sobre formigas, vespas e abelhas (Quadro 8: Nos^ 26,
54 e 86). Há registro, inclusive, de uma vespa que gosta de
comer com as pessoas e chega até a lamentar a morte de com-
panheiros humanos com os quais partilhou comida (No. 77).
As relações de comensalidade (comer como e com al-
guém) na Amazônia também foram analisadas por Fausto
(2002) como formas de produção de parentesco. Este autor
conclui que “a partilha do alimento e do código culinário
fabrica pessoas da mesma espécie”. Não é a ideia biológica de
que pessoas e vespas pertençam a uma espécie, mas sim a
noção de perspectiva de que estes seres compartilham de uma
mesma essência, na qual comer, chorar e sentir saudades são
ações típicas tanto da humanidade quanto da animalidade
(Ingold, 1999).
Este grupo de insetos pode ser apreendido linguistica-
mente por meio de três classificadores numéricos:
1. -da (arredondado): Formicidae ( kadáadali (rainha),
káiwiri (rainha); Vespidae ( hipolédawaro ) e Apidae ( kéttole ,
koe-mápani , mapolhédawaro , moóne , pathipíra , tsiimóda ).
2. -aápa (alongado): Formicidae ( ámali , maderíapa ,
mamawipíxeni , wánali-ikapítsire , kettolíapa ) e Apidae ( dza-
wi-mápani , kottéero , piñéero , adáro , awarána , domalíwi ,
dzapáita , dzawi-náapa , hálani , iipéeko , iiwipíra , kaáme ,
perikámheni , tsháali , táapa , ttípami ).
3. -iíta (achatado e masculino): Vespidae ( adáro , áini ,
awarána , domalíwi , dzapáita , dzawi-náapa , émoro , hálani,
iipéeko, iiwipíra, kaáme , kátimi, maadenháali , panapíto ,
phitsíiñai , píithero , táapa , ttípami ; Formicidae ( ámali , made-
ríapa , áakaali , aalámoni , ame , atápa , dóowhero , dzáwaaro,
eekonómali , kadáadali , kadzawitakaápa , káiwiri , kawípe ,
kétsi , kóowhe , maáka , mánee , piítti , potsída , tátaale , toóme ,
ttiñaliwáire , ttowíapa , wénhi , wéphi , wíidzo ) e Apidae ( dzái-
ta , dzawi-mápani , énoi , keráde , koe-mápani , máapa , mapí-
wa ).
Formigas, como as saúvas, classificadas como Paihani-
pé (comestíveis), são lembradas durante o ritual de benzimen-
to dos alimentos ( Kalidzámai ) realizado por benzedores. No
caso das mulheres em específico, este tipo de benzimento é
muito importante, pois as saúvas, assim como as maniuaras
( Keetonai ), podem ser capazes de provocar uma doença da
feminilidade ( Hiwiathi ), caso a mulher não tenha recebido os
devidos benzimentos, não tenha cumprido os rituais de passa-
gem ou desobedecido as regras de restrição alimentar.
Para os Baniwa, a subfamília Myrmicinae é associada
às saúvas ( Kóowhenai ), Ponerinae às tocandiras ( Máneenai ) e
Ecitoninae às taocas ( Áakaalinai ). O sufixo nai significa “em
geral”, marca do plural na língua Baniwa (Ramirez, 2001).
Alguns Myrmicinae ( Kóowhenai ) são classificados junto com
os peixes, como Kophénai. A origem desse fato tem explica-
ção na mitologia Baniwa, onde é citado que três tipos de
saúvas surgiram a partir dos restos de três tipos de peixes
(Garnelo et al. , 2005). Estas formigas são: kadáadali , kowhé e
piítti.
Entre os Baniwa, as abelhas também costumam ser en-
tidades que participam nas histórias míticas. O narrador Ma-
nuel da Silva (Cornelio et al ., 1999) conta em um trecho da
história “ Kuwaikaniri , ou Mawirikuli , a primeira pessoa a
morrer” a presença de espíritos-abelhas (os Kuwainyai ) no
momento em que iam matar Nhãpirikuli , o deus criador para
os Baniwa. Mais uma vez deixando claro que os insetos po-
dem possuir a mesma essência que a dos humanos; neste
caso, o fato de estes insetos também serem dotados de espíri-
to.
E, apenas para ilustrar de maneira mais concreta a idios-
sincrasia Baniwa, em frente à comunidade Taiaçú-cachoeira
(baixo Içana), abaixo de Tunuí-cacheira, existe um lugar
sagrado considerado como a pedra das abelhas (Trinho Paiva
- comunicação pessoal), onde se acredita terem nascido todas
as abelhas e onde elas se encontravam para fazer “dabucuri”
( pódaali ), festa ritual onde há oferta de comida e bens materi-
ais (Ramirez, 2001).
● LEPIDOPTERA
Estes insetos são apreendidos linguisticamente pelos Baniwa
de três formas: achatado e pertencente ao gênero masculino,
por meio do classificador numérico -iíta ( aatáka , dzawíkaro e
makálo ); alongado pelo classificador -aápa ( tháara , kadaápa-
li ); arredondado pelo classificador -da ( dzéeka-íixeni , eedái-
koro , póottaro ) e filiforme pelo classificador -khaa utilizado
apenas para algumas lagartas ( áakooro , dzéeka-íixeni , hipolé-
koro , kadaápali , mattípero , meetshákoro , tokotokó-xeni ).
Todos estes nomes em Baniwa podem ser encontrados no
Quadro 10.
Muitas borboletas e mariposas são classificadas como
Awakadalikaperi (um tipo de Yoopinai , seres maléficos que
andam no mato). Os Baniwa acreditam que se pousarem na
roupa da pessoa podem causar coceiras ou se pousam na
comida, estragam-na.
No. Nome Baniwa Nome português
Nome científico
Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
35 tátaale^1 / tátaole* - Cephalotes atratus Linn., 1758
Vive na roça, faz casa no buraco de pau. Sua cabeça parece com a de uma ave de mesmo nome (cancão - tátale ).
Inhuãkapé (mordem)
PONERINAE ( Máneenai )
36 mánee^1
Tocandira
Paraponera clavata Fabricius, 1775 Dinoponera gigantea Perty, 1833
Certas formigas de grande porte que vivem na terra ou nos tocos de pau na roça, em vegetações de terra firme ou em campinarana. Podem atacar folhas de cubiu ou de mandioca. Faz casa grande de barro e limpa bem (retira as folhas) ao redor da casa.
Yokukapé (ferram)
37 *mánee madoiniri - Vive na terra firme e faz ninho subterrâneo.
38 máneeiphékolo^1
Paraponera ou Dinoponera
Tocandira que possui asas.
39 *mánee itáite - Encontrados na terra firme. 40 *mánee iráite - Tocandira vermelha. 41 *mánee keramáite - Tocandira marrom.
42 ttoowíapa^1
Pachycondyla crassinoda Latreille, 1802
Vive em área de terra firme.
43 *pedaliamihitsiwi - Um tipo de mánee que vive em grupos que podem flechar.
44 kettolíapa^1 -
P. villosa Fabricius, 1804
Certo tipo de formiga.
45 *dóotero - Dinoponera sp. Vive no capim que cresce na roça. 46 *atápa - Odontomachus Um tipo de formiga.
kadzawitakaápa/ kéthiwi^1
Pentelho- de-velha
Odontomachus haematodus Linna- eus, 1758
Vive ao redor de palmeiras na terra firme.
48 wánali-ikapítsire^1 - O. hastatus^ Fabricius, 1804
Um tipo de formiga de picada dolorosa.
49 ámali^1 -
Ectatomma quadri- dens Fabr. E. tuberculatum Olivier
Um tipo de formiga pequena e preta, de picada dolorosa. Encontrado na terra firme. Faz buraco no solo da roça.
(^50) *ámali itáite - - Encontradas na terra firme. 51 *ámali iráite - - Um tipo de formiga pequena e vermelha. ECITONINAE ( Áakaalinai )
52 áakaali^1
Taoca
Eciton vagans Olivier, 1791
Um tipo de formiga de correição encontrado no caminho da roça. Pode ser preto, vermelho ou cego.
Yokukapé (ferram) 53
ttiñaliwáire^1 / *áakaali halehiwi- dále
E. hamatum Fabr., 1781
É amarelo. Anda em grupo de muitos, espantam tudo quando andam no mato e também guerreiam. Se ferrar uma moça, significa que ela vai casar com um homem velho, porque essa formiga possui cabelo branco. VESPOIDEA
54 áini^1 Vespa, caba Vespidae
Sua casa pode ser encontrada na folha de qualquer palmeira em área de campinarana ou em igapó. Áini íipana - vespeiro; áini iaróda - casa de cabas; áini íewhe - ovo de caba; áini iewhéeta - conjunto de alvéolos; áini íiwi - ferrão de caba; eewheróaphi - alvéolo de caba.
Yokukapé (ferram)
dzawi-náapa^1 / yawináapa*
Caba Sphecidae
Um tipo de caba grande que pode ser encontrada na campina ou no caminho da roça. Faz um buraco embaixo da terra e pode comer aranha ou grilos. 56 perikámheni^1 Meiu-kawa Apoica sp. Um tipo de caba grande e amarela. 57 táapa^1 Caba-da-noite Apoica sp. Um tipo de caba grande e noturna. 58 ttípami^1 Caba-de-peixe Angiopolybia Um tipo de caba amarela. 59 iipeéko^1 / mókoli^1 Caba Stelopolybia sp. Certo tipo de caba que vive dentro dos paus.
60 *kaxalábini - Angiopolybia sp.
Fica no roçado, na capoeira, em área de terra firme ou na beira do rio. Faz casa ( kaxalábini ípana) em forma de peito ( iapí- koahẽapari).
61 domalíwi^1 Caba
Pseudopolybia langi Bequard, 1944 Um tipo de caba pequena de picada muito dolorosa. 62 kalimáto^1 - Trypoxylon sp. Caba solitária que vive em uma casa de barro.
(^63) maadenháali^1 - (^) Stictia sp. Um tipo de caba listrada que vive na terra. Uma vez que seu ferrão é retirado, serve de brinquedo quando amarrado a um fio.
64 tsháali^1 / aalídali^1 Tatu-caba
Synoecoides depressus Ducke, 1905
São graúdos e pretos. Sua casa tem a forma de um casco de tatu e vive na beira do rio. Se olhar pra casa dele e franzir a testa, pra sempre ela ficará franzida.
65 awarána^1 Caba-de-peixe -
Vive no oco dos paus e possui picada muito dolorosa. Vive em área de terra firme. (^66) dzapáita^1 Mangerona - Um tipo de caba caseira e avermelhada que ferra.
67 hálani^1 Tatu-caba -
De picada muito dolorosa, faz seu vespeiro no tronco das árvores. 68 hipolédawaro^1 Caba - Caba pequena e esverdeada, mais encontrada na roça. 69 phitsíiñai^1 Acuti-kawa - Um tipo de caba preta encontrada no igapó. 70 adáro^1 Caba
- Vive dentro de um formigueiro.
71 iiwipíra^1 -
Um tipo de caba que possui a casa em forma de um aturá grande.
No. Nome Baniwa Nome português
Nome científico
Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
72 kátimi^1 - Um tipo de caba pequena e amarelinha que ferra. Possui vespeiro afunilado construído debaixo das folhas. 73 iipéeko^1 - Caba grande, parente de kátimi.
74 panapíto^1 - Um tipo de caba pequena que faz sua casa debaixo das folhas, em área de terra firme ou campinarana. 75 *makoeda - Um tipo de caba.
76 *katsóolupi - Cabas amarelas que vivem em grupos. Faz casa na folha de arumã ou de açaí.
Yoopinai (doença)
77 *kaialábilu -
Faz casa debaixo das folhas. Essa caba gosta de comer com as pessoas no mato e até lamenta quando uma pessoa com quem ele comeu morre. Maokukapé (não ferram)
78 *péete -
Sua casa parece um beiju. Se a pessoa sovinar beiju, pode ser ferrada por essa caba.
79 *kaátsi -
Sua casa parece um caranguejo. Encontrado em áreas de terra firme, campinarana ou igapó.
80 píithero^1 Tapiocaba -
É brabo e faz casa nos galhos em área de terra firme ou no igapó.
Yokukapé (ferram) Yoopinai (podem causar doença) 81 *piténi - - Um tipo de vespa que constrói casa e não é brabo. - 82 émoro^1 Vespa - Um tipo de vespa do tamanho da mamangaba. - 83 *piítti- píithero - - Um tipo de caba. - 84 toópi^1 Caba
- Um tipo de caba. - 85 kaáme^1 - Um tipo de caba grande. - APOIDEA
86 máapa^1 Abelha
Apidae
Encontrada em área de campinarana ( Anelima ). Máapa íipana / máapa idzákale - colméia; maapána - árvore onde vivem abelhas; mapadóña - cera de abelha; maapéewhe - ovo/ larva de abelha; mápaa/ máapa ídoni - mel de abelha; liewheróaphi - alvéolo de abelha.
*máapa haikoliku- péri
Um tipo de abelha que produz mel na árvore e pode ser encontrada em área de campinarana.
88 thipíra^1 / pathipíra^1 Lambe-olhos Meliponinae Encontrada em área de campinarana. - (^89) moóne^1 Mamangava
(^1) Melipona sp.
Abelha grande de picada dolorosa. Yokukapé (ferram) 90 *moóne itapéri Um tipo de mamangava. 91 mapíwa^1 / mapíwao Abelha tímida Produz mel doce. Encontrado em área de igapó. - 92 dzawi-mápani^1 Abelha-onça Produz um mel mais doce. -
(^93) keráde^1 Jandaíra/ abelha brilhosa
Um tipo de abelha que produz mel doce, econtrado em área de igapó.
94 kéttole^1
Abelha acinzen- tada
(^1) Melipona eburnea Friese, 1900
Um tipo de abelha que produz mel doce e é encontrada em área de igapó. -
95 2 monedape
Abelha de mangaba Melipona^ sp.^ Fonte: Fernandes^ et. al.,^^2009 -
96 mapolhédawaro^1
Lambe-olhos/ abelha cisco dos olhos
(^1) Trigonini Constrói sua própria casa e faz mel. Encontrado em área de igapó. Pode entrar no olho e arder igual pimenta.
97 koe-mápani^1 - 1 Scaptotrigona sp. Produz mel azedo. Kiníkipira (praga de roça) 98^2 ttidzeemapani Abelha-de-fogo
(^1) Trigonini
Um tipo de abelha. -
99 kottéero^1 Abelha brava
Um tipo de abelha pequena, amarela e muito brava. Produz mel ruim, ninguém come.
100 énoi^1
Uruçu/ abelha do universo
Um tipo de abelha. -
101 2 koitsimapani
Abelha de mutum
102 2 manapimapani
Abelha de sarapó pintado
103 2 kamaramapani Abelha de cupim
104 2 phitsimapani Abelha de cutia - 105 piñéero^1 - - Suga as flores de uacú. É atraído pelo suor da gente. -
106
tsiimóda^1 / maapa- dáada
- Um tipo de abelha preta que libera um cheiro forte. Maokukapé (não ferram)
(^107) dzáite^1 - - Um tipo de abelha. - 108 *yaíta - - Um tipo de abelha. - *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001); 2 Nome associado através do guia “Criação de Abelhas sem ferrão” elaborado por pesquisadores Baniwa da comunidade Tunuí-cachoeira (Fernandes et al., 2009); - Informação ausente.
Duas lagartas foram classificadas como comestíveis
( dzáko e kadaápali ) entre os Baniwa, porém este não é o
primeiro relato de lagartas comestíveis. Dufour (1987) regis-
trou a coleta e o consumo de duas espécies de lagartas coloni-
ais entre os povos Tukano.
Os Baniwa também têm conhecimento sobre uma parte
do ciclo de vida dos Lepidoptera: áakoro ipadámaka maká-
lowa , a lagarta se transforma em borboleta (Ramirez, 2001).
Na língua Baniwa, Padáma (kawa) é o verbo que significa
transformar-se, metamorfosear-se.
Sobre os Lepidoptera, temos muito mais hipóteses que
dados a serem confirmados pela ciência. Alguns conhecimen-
tos registrados no Quadro 9 são informações não registradas
na literatura: Euselasia sp. (Riodinidae) vive na folha do
maracujá azedo; lagartas de Megalopygidae são pragas de
abiuzeiro, açaizeiro, ingazeiro e mandioca; lagartas de Nym-
phalidae são pragas da mandioca.
● DIPTERA
Os Diptera são apreendidos linguisticamente como masculino
e achatado pelo classificador numérico -iíta ( dzáwaaro , héeri ,
hema-hérini , máapiiri , ttóottooni ), alongado pelo classificador
-aápa ( ainíidzo , dzáwaaro , héeri , hema-hérini , koóri , waa-
péewi ) e arredondado pelo classificador -da ( aapidza-mápire ,
doólo , dóota , íitsi-mápire , kérheni , poopó , porówa , toonóda ).
Informações sobre esses insetos estão no Quadro 11.
Sobre estes Insecta temos as seguintes hipóteses a serem
confirmadas pela entomologia: Simuliidae vive com as quei-
xadas ( Tayassu pecari Link, 1975); larvas de Diptera no ci-
lindro de arumã ( Ischnosiphon polyphyllus Poepp. & Endl.);
larvas de M. domestica , Calliphoridae, Sciaridae encontradas
por todo o corpo de cutia ( Dasyprocta aguti L., 1766).
Em Tunuí-cachoeira há um fragmento rochoso de cor
laranja-avermelhado denominado pelos Baniwa de Máapiiri-
numáwa. É um lugar sagrado, considerado pelos mais velhos
como o local onde os máapiiri (Simuliidae) levavam todo o
sangue que chupavam (Graciliano e esposa, comunicação
pessoal). Entomologicamente, isto faria certa lógica se pen-
sarmos que são as fêmeas que sugam o sangue para poder
garantir a maturação de seus ovos; em seguida, partem para os
fragmentos rochosos e encachoeirados para realizar a ovopo-
sição.
● HABITAT DE ALGUNS INSECTA E OS TIPOS DE VEGETAÇÃO
SEGUNDO A PERCEPÇÃO BANIWA
Os Baniwa reconhecem exatamente o local de ocorrência dos
insetos, em qual tipo de vegetação podem ser encontrados
(Quadro 12). Os tipos de vegetação são descritos no Quadro
Na terra-firme, por exemplo, temos um tipo de vegeta-
ção conhecida pelos Baniwa como Awíñalima , uma vegetação
localizada sobre terra amarela argilosa, rica em Awíña (uacú),
uma árvore frutífera de grande porte da família das legumino-
sas ( Monopteryx uacu Spruce). Neste tipo de vegetação foi
relatada a presença de três tipos de insetos: mánee (tocandira
que constrói ninho de barro), áakaali (taoca, um tipo de for-
miga de correição) e iiwipíra (um tipo de vespa).
Em campinarana, um dos tipos de vegetação mais co-
nhecido é a Waapalima , única vegetação de campinarana que
permite o cultivo de mandioca. Nela podemos encontrar três
tipos de insetos: keéttonai (maniuara), maáki (outro tipo de
maniuara) e iiwipíra (uma caba).
No igapó, uma das vegetações mais conhecidas é a Ma-
inirima , que possui predominância de árvores que liberam
breu. Neste tipo de vegetação foi relatado que ocorrem áako-
oro (lagarta) e poléta (barata).
Conclusão
Para os Baniwa da cidade de São Gabriel, os insetos são utili-
zados para diferentes finalidades: fonte alternativa de proteí-
nas, iscas de pesca, remédios naturais e também são mencio-
nados em benzimentos, crenças e brincadeiras. Tais conheci-
mentos sobre os insetos são importantes para nortear a vida
Baniwa, como poder orientar-se em relação às horas do dia,
identificar épocas da piracema, evitar acidentes com vespas e
formigas, obter fonte de proteína, remédios naturais, iscas de
pesca, auxílio para as atividades de caça e até criar brinquedos
e brincadeiras. Este conjunto completo de saberes e técnicas
são ensinados pelos pais às crianças.
Muito do conhecimento entomológico Baniwa encontra
correspondência ao da ciência entomológica (morfologia
externa, ocorrência de insetos em determinados tipos de vege-
tação e taxonomia). Já a classificação entomológica Baniwa
parece estar mais baseada em termos utilitários (ex.: Paihani-
pé , comestíveis, e Kinikipíra , pragas de roça), crenças ( Awa-
karóna (espírito da floresta/curupira)) e nas famosas classes
de doenças baniwas (ex.: Kawalerikaperi , um Yoopinai que
anda no vento).
Contribuir para o ensino-aprendizagem das escolas Ba-
niwa, fortalecimento cultural e melhoria na qualidade de vida
dos povos Baniwa que vivem na cidade de São Gabriel da
Cachoeira, configurou-se como propósito norteador desta
pesquisa. Porém, este propósito somente tornar-se-á possível
através do interesse, vontade e empenho das comunidades
científica e Baniwa envolvidas nesta pesquisa, bem como do
apoio de instituições parceiras e de financiamento à pesquisa
(FAPs).
Agradecimentos
Ao INPA pelos recursos humanos e de infraestrutura que possibilita-
ram a realização deste projeto de pesquisa. À CAPES pela bolsa de
pesquisa. Aos projetos Fronteiras e PRONEX-CNPq-FAPEAM
através de financiamentos provenientes do CNPq, FINEP e
FAPEAM. Às Dras. Elizabeth Gusmão, Lúcia Yuyama e Ruth
Keppler pelo apoio, incentivo e valiosas orientações que concederam
a esta pesquisa. Às comunidades Areal, Itacoatiara-Mirim e Vila
Amazonino pelo apoio e interesse na pesquisa. Ao apoio inicial do
DSEI (Francivalda e Kiko), da Prefeitura de SGC (André Fernando
Baniwa), Comando da 2ª. Brigada de Infantaria de Selva/2009 e do
IFAM - Campus São Gabriel da Cachoeira.
Quadro 11. Conhecimento entomológico Baniwa (CEB) sobre Diptera (moscas e mosquitos).
Nº Nome Baniwa
Nome português
Nome científico Dados etnoentomológicos Classificação Baniwa
NEMATOCERA
01 ainíidzo^1 Carapanã Chironomidae, Tipulidae, Limoniidae, Culicidae
Encontrado em área de terra firme, campinarana e igapó.
Iarakapé (voam)/ Irakapé (picam e chupam sangue)/ Yoopinai (podem causar doença)
02 máapiiri^1
Borrachudo/ pium
Simuliidae
Inseto hematófago encontrado em área de terra firme.
Iarakapé (voam)/ Inhuãkapé (mor- dem)/ Yoopinai (podem causar doença)
03
*máapiiri- itapalíphe Encontrado em área de terra firme.
Iarakapé (voam)/ Inhuãkapé (mordem)
05 toonóda^1
Um tipo de pium silvestre que aparece em tempo nublado. Encontrado em área de terra firme e campinarana.
apáda íitsi^1 / itsi-máapiiri^1 / máapiiri-ítsi^1
Pium grande e vermelho/ amarelo que voa de dia, encon- trado na terra firme.
aapidza- máapii- ri^1 Pium que vive com as queixadas. 08 porówa^1 Mosquito
- Um tipo de mosca minúscula. Iarakapé (voam) 09 *harekápili Culicidae É um ainíidzo que tem as mãos brancas. Iarakapé (voam)/ Irakapé (picam e 10 ttóottooni chupam sangue) 1 Maruim Ceratopogonidae
Inseto hematófago de hábitos crepusculares. 11 kérheni^1 Um tipo de maruim noturno. BRACHYCERA
12 doólo^1 / duuru^2 Mosca doméstica
Musca domestica L. Calliphoridae/ Sciaridae
Mosca brejeira. Os tapurus podem ser encontrados em todo o corpo da cutia. Dolóewhe - ovo de mosca e dólheni - larva de mosca.
Yoopinai (podem causar doença)
13 *dzapoláda - Calliphoridae/ Sciaridae É um dóolo grandão que se alimenta de frutas doces.
Iarakapé (voam)
14 *dáapa-dóolonai
Serve como remédio pra caçar paca. Antes de caçar, o caçador pode torrar e comer ou esfregar nas mãos e passar na pele.
15 dóota^1 Um tipo de mosca verde.^ Dootéeewhe^ - ovo de mosca verde. 16 *móoda Parente de doólo que serve como remédio.
17 póopo^1 Um tipo de mosca minúscula encontrada em área de campinarana. 18 puupu^2 - M. domestica Mosca comum. 19 *kawadáro - - Um tipo de mosca encontrada em área de campinarana.
20 dzáwhero^1 -
Tabanidae
Um tipo de mutuca grande. Iarakapé^ (voam)/^ Irakapé^ (picam e chupam sangue)
21 héeri^1 Mutuca
Ele chupa sangue de pessoas e de animais. Vive próximo de igarapés de terra firme, campinarana e no igapó. Héerie- ni – seus filhotes. Iarakapé (voam)/ Irakapé (picam e chupam sangue)
22 *héeri-kóori Encontrado no igapó.
23
héma-hérini^1 / herináali^1
Mutuca de anta Um tipo de mutuca grande. 24 waapéewi^1 Flor de jebaru Um tipo de mutuca pequena. LARVAS
25 wayáwa íixeni^1 Tapuru de goiaba
Hitsiakapé (rastejam) 26 iixenítti^1 Tapuru - -
27 íixeni^1 Larva de mosca
Muscidae Entram na pele de seres humanos, animais ou vegetais. Yoopinai (podem causar doença)
28 *hipadaíxeni Larva de pedra
- Vive nas pedras do rio. -
(^29) *kophé íixeni Larva de peixe
30 itsiríixeni^1
Tapuru de caça -^ Encontrado embaixo da pele de cotia. Hitsiakapé (rastejam)/ Yoopinai 31 *Poá Poá íixeni (^) (podem causar doença)
Tapuru do arumã -^
É branco e gordo. Prejudica o crescimento do arumã. Fica dentro do cilindro do arumã.
32 * dolhéni
Tapuru/ Bicheira -^
Transforma em dóolo , vive na pele de pessoas, animais de caça ou de criação. *Novos nomes encontrados através desta pesquisa (2009-2010); 1 Nome encontrado em Ramirez (2001); 2 Explicação encontrada em Taylor et al. (1993); - Informação ausente.
Nº. Terra firme ( Éedzawa )
Campinarana ( Hamáliani^2 )
Igapó ( Alápe ) grande da família das lauráceas utilizada para fazer canoas^1 e travessões^3.
pólos de pesca. abacaxi, comida de animais de casco^3.
11 Káalihalédali ou Ihipaihaledale - vegetação sobre tabatinga/ terra argilosa (A5, F2). Káali - barro branco usado para fazer a base dos fornos e para branquear casas e potes^1.
- Koliwaipalima – sub-bosque com bastante entrada de luz. Koliwáipa - certo tipo de bromeliácea da caatinga cujo fruto é comestível^1.
Kodupirimã - a mais alta árvore que ocorre no igapó, serve como abrigo para peixes no período da cheia, ideal para colocar anzóis^3. 12 Kaanerimã - situada sobre terra amarela, fornece madeira leve usada para canoa e tábuas^3.
Kuiaperimã - palmeira baixa com frutos comestíveis, a folha é usada para confecção de barracas^3.
Kumerimã - árvore com frutos consumi- dos por peixes e pássaros^3. 13 Kadapolima - vegetação onde se coleta caniço de pesca e que possui terra boa para o cultivo de mandioca (AF). Situada sobre terra amarela e preta^3. Kadaápo - certo tipo de arbusto silvestre que serve para fazer caniços de pesca, chicotes rituais e para benzer^1.
- Maarolima – floresta de dossel fechado com a presença de maaro ( Pouteria sp.) no sub-bosque. Máaro - marapa- ri, certa árvore cuja madeira serve para construção de casa^1.
Mainirima - vegetação com predominân- cia de árvores que liberam breu (P1, A9). Máini - breu, árvore que fornece o breu^1.
14 Kaidapé - vegetação sobre terreno arenoso misturado com terra firme (AF). Káida - areia, praia.
- Maporottirima – solos esgotados com espécies de floresta secundária, associados à pousios agrícolas em campinarana. Área utilizada para roças pequenas e de baixa produtividade^3. Maporótti - umiri, certa árvore da família das humiriáceas ( Humiria floribunda )^1.
Manakheríma (N1) - açaizal (Ramirez, 2001). Açaí-do-igapó^3.
15 Kauitirririmã - Loiro, usado para canoa e tábuas. Vegetação situada sobre terra amarela^3.
- Ponamalíma – áreas úmidas ou alagadiças com a presença de frutíferas ( Ponama – Oenocarpus batahua). Patauazal (Ramirez, 2001).
Maporimã - fornece madeira boa para tábuas^3.
16 Kerrerririmã - Pau-brasil^3. * Poramolima - áreas úmidas ou alagadiças com a presença de porámo ( Euterpe caatinga ). Porámo - açaí- da-caatinga (fruto de uma palmeira)^1.
Marrakerimã - possui árvores de frutos doces, consumidos por peixes e pacas^3.
17 Kóonolima - (J1). Kóonoli - certa árvore silvestre cujos frutos venenosos são comestíveis após preparação^1.
- Ttiñalima – caranazal, áreas alagadiças onde há pre- sença da palmeira caraná^1 , utilizada na cobertura das casas.
Neríthi - (F1). Olho-de-veado, certo tipo de cipó ribeirinho cujo fruto é comestí- vel^1. 18 Mãinhitirimã - sem utilização, fruto não comestivel^3. * Waalialima – vegetação aberta tipo savana com áreas de bancos de areia expostos. Wáalia - certo tipo de umiri pequeno, árvore da família das humiriáceas^1.
Pitirriurepapidarimã - local de abrigo de peixes e cipó que ocorre às margens de igarapés e lagos, considerado remédio para diversas feridas^3. 19 Maipanarririmã - situada sobre terra amarelada, apresenta árvore com frutos comestiveis^3.
- Waapalima – única vegetação de campinarana que permite o cultivo de mandioca. Waápa - jebaru, certa árvore silvestre de grande porte cuja casca é usada com certas flautas sagradas^1.
Yáwalilima - (L1). Yáwali - jauari, certo tipo de palmeira espinhosa^1 que fornece frutos e sementes comestiveis^3.
20 Maripunenirimã - situada sobre terra preta ou amarela, apre- senta palmeiras pequenas utilizadas para a cobertura de casas^3.
- Waittilima – sub-bosque de bromélias, orquídeas e cladônias. Formação muito aberta e seca, com arvores de tronco grosso e baixo, de frutos não comestiveis^3.
Uacherimã - árvore que produz uma castanha comestível e possui uma madeira muito resistente^3. 21 Mokolirima - (N1). Possui uma das melhores terras pretas, própria para o plantio de banana, batata, pimenta e milho^3. Móokoli - madeira trançada, certo tipo de árvore da terra firme^1 ; a paca come as sementes dos frutos desta árvore (não comes- tíveis)^3.
Zakoirimã - fornece frutos comestíveis e madeira para canoa^3.
Ehidalima - (M3).
22 Molirima - (S1, N1). Móoli - cedro, certa árvore da terra firme cuja madeira serve para fazer canoas^1. Situada sobre terra preta e amarela^3.
Halepéwida - (J5). Ixedoni - (F1).
23 Paitsaletáka - (J5). Paítsani - carapanaúba, certa árvore silvestre cuja madeira serve para fazer cabos^1.
Malatalima - (F2). Kettipanalidaliko - (F2).
24 Póoperilima : bacabal (J1, P1, A3, N1). Póoperi - bacaba, fruto da palmeira Oenocarpus , com o qual se fazem bebidas.
Mapitakolima - (A3). Konenaluko - (F1).
25 Puparimã - paxiúba, serve para fazer ripas^3. Poletaonelima - (J5). Palawalikom - (J5). 26 Ripoliirimã - situada sobre terra amarelada, apresenta grande árvore com frutos não comestiveis^3.
Periperilima/ Pelipelidáliko - (S2, F2).
27 Ritauarimã - situada sobre terra preta e mais grossa, pode-se encontrar uma grande árvore com reentrância no tronco^3.
Tawadalima - (M3).
28 Taphirima - vegetação formada de um tipo de palmeira pareci- da com o inajá (M4).
Wadápe - (J5).
(^29) Tsitamédali - vegetação sobre terra fértil e grossa (H1, G2). Terra argilosa, boa para o plantio de mandioca e banana (AF).
Wiriwirilima - (M3).
30 Ttoóphiilima - (S1, M3). Situada sobre terra preta ou amarela^3. Ttoóphii - acariquara, árvore de madeira muito resistente, da família das olacáceas ( Minquartia )^1 , usada como esteio^3.
Yolináli - (S1).
31 Uadarimã - situada sobre terra amarela, refere-se a uma árvore grande com frutos comestíveis^3.
32 Urrukairimã - a resina é usada para dores corporais, queimada ou em infusão^3. (^33) Outros tipos de terra firme reconhecidos: Hemádoa - (S1), Makadaliphiádalihipai - (F4), Paomédali - (F3), Tekowiriliko - (J5), Temipã - (S2), Tsaimidáli - (S2) e Ypéliko - (J5). Obs.: As siglas entre parênteses referem-se aos nomes dos participantes, que devem ser mantidos em sigilo pela ética deste tipo de pesquisa. O fato de a maioria das palavras terminar em - líma , se deve ao fato de este ser um sufixo nominal que marca o coletivo na língua Baniwa (Ramirez, 2001). *Abraão et al. (2008). 1 Ramirez (2001); 2 Certo tipo de caatinga baixa (Ramirez, 2001);^3 Fernando José, Paulino Alberto Joaquim e Pedro Gabriel da Silva em Cabalzar & Ricardo (2006); - Informação ausente.
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